A morte do filho de Judite Sousa estará a ser usada em várias redes sociais para criar listas de contactos que são vendidas a empresas de telemarketing. Uma mensagem divulgada por um grupo do Facebook será supostamente uma fraude. A diretora-adjunta de Informação da TVI está em retiro e raramente publica mensagens na sua página pessoal. A Polícia Judiciária está atenta a estas práticas e garante que elas estão a ser devidamente investigadas. Porém, lembra que muita da prevenção parte dos próprios utilizadores da Internet.
O esquema para rentabilizar a tragédia dos famosos é simples, segundo explicou Rui Cruz, um especialista na utilização de redes sociais, ex-cronista de assuntos informáticos no extinto jornal O Crime. “Estamos perante um vazio legal. Quando se deu o caso da morte do Angélico Vieira, eu criei uma página de apoio ao cantor/ator e faturei mais de dez mil euros só em cliques. Claro que nunca usei os dados pessoais das pessoas para os vender, mas sei que essa é uma prática usual e que também rende muito dinheiro”, afirma.
Tiago Cardoso Pinto, outro especialista nas novas tecnologias, é peremptório: “Só não aproveita quem não quiser. As tragédias com figuras famosas são um manancial de dinheiro no mundo virtual. Copiam-se notícias de jornais nacionais e estrangeiros e depois é só receber pelos cliques. Mas há outra forma, mais elaborada, que dá ainda mais dinheiro, que é criar páginas de apoio às pessoas famosas que perdem entes queridos, como é o caso da Judite Sousa, ou de personagens conhecidas que também perderam a vida, como Michael Jackson ou Freddie Mercury.”
Segundo a VIP apurou, haverá grupos do Facebook e de outras redes sociais que estarão a ser usados para criar redes de contactos que depois são vendidos a empresas de telemarketing ou que atraem para chamadas telefónicas de valor acrescentado. A mensagem lançada no Facebook, e alegadamente escrita pela jornalista Judite Sousa, será falsa. A própria jornalista já confidenciou a amigos que nunca escreveu aquela mensagem, embora tenha “gostado do seu conteúdo”.
Tiago Cardoso Pinto explica como tudo funciona: “Uma pessoa tem um perfil aberto no Facebook. Coloca um ‘gosto’ na página de apoio à pessoa ‘X, e de imediato fica exposta. Se ela não tiver qualquer restrição no seu perfil ou página, é possível ter acesso a todos os dados que lá foram colocados e, inclusive, às fotografias. Acede-se, assim, aos e-mails, telefones, moradas, profissão e por aí fora. Depois, é só construir uma base de dados. Existem empresas de telemarketing que pagam, no mínimo, cinco euros por cada contacto. Se arranjar mil através do Facebook e vender a uma dessas empresas são logo cinco mil euros na conta bancária. Como é óbvio, criar um perfil de apoio a figuras públicas como a Judite Sousa significa ter mais ‘gostos’ e acesso a mais perfis de utilizadores das redes sociais”, explica o especialista em novas tecnologias.
As autoridades estão a investigar estas práticas, que ainda não são consideradas crime público pela nossa legislação, embora as leis já tenham sido aperfeiçoadas. No entanto, a verdade é que a morte do filho de Judite Sousa será apenas a ponta de um icebergue de negócios emergentes na Internet, cujos beneficiários terão descoberto uma lacuna na nossa legislação, conseguindo, assim, a obtenção, por parte dos criadores de tais páginas ou perfis, de milhares de euros. Os criadores destes falsos perfis lucram, de uma forma simples, com as tragédias alheias.
“Temos a indicação de que poderá existir quem esteja a lucrar copiando notícias divulgadas pelos órgãos de comunicação social sobre pessoas famosas e aqueles que utilizam as redes sociais para obter dados como contactos telefónicos de pessoas, dados biográficos, perfis e e-mails, que depois vendem a empresas de telemarketing. As informações são, supostamente, obtidas de forma ilegal. A PJ está atenta a esse fenómeno”, revelou à VIP Carlos Cabreiro, um alto responsável da Polícia Judiciária e coordenador da Secção de Investigação de Crimes Informáticos, um departamento interno existente naquela força policial e que presta apoio a todas as diretorias nacionais quando é preciso analisar dados comunicados através da Internet, discos rígidos de computadores ou telecomunicações.
De acordo com Carlos Cabreiro, a criação de páginas de apoio a personalidades e com conteúdos que não são da sua autoria não serão legítimas: “É certo que ninguém força as pessoas a colocar os seus dados pessoais nas redes sociais, mas o fim último pode ser ilegal. A PJ tem advertido para os riscos que essa divulgação poderá implicar. Mas também é verdade que a utilização desses dados para outros fins não é permitida legalmente. Aquilo que pedimos é que as pessoas que se sintam lesadas façam as denúncias respetivas e cá estaremos para investigar."
"Além disso, usar perfis de pessoas para fins diversos, sem elas autorizarem expressamente, não são formas de atuação legítimas. Criar perfis falsos com mensagens alegadamente da autoria dessas pessoas menos ainda. Estamos a falar de um claro aproveitamento da imagem e do nome das pessoas. Esta não é a forma correta de se obterem dados pessoais e indicia atos preparatórios de quem recolhe esses mesmos dados e de quem supostamente os adquire”, defende Carlos Cabreiro.
A VIP tentou obter um esclarecimento junto de Maria Calvão, presidente da Comissão Nacional de Proteção de Dados, mas até ao fecho da edição, ninguém daquela instituição prestou declarações.
Texto: Carlos Tomás; Fotos: Impala e DR
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