Chama-se Teresa Almeida, é do Vimeiro, começou a praticar bodyboard com 13 anos e hoje, aos 22, é campeã do Mundo. Foi no final de 2014 que conquistou a medalha de ouro no escalão feminino do Mundial organizado pela Associação Internacional de Surf, tornando-se a segunda portuguesa da história a arrecadar o título. Mas, em conversa com a VIP, a jovem revela que pretende alcançar muitas outras vitórias. O plano é “treinar muito” e “apanhar” as melhores ondas…
VIP – Começo por lhe perguntar: ser a melhor do Mundo aos 22 anos não é um peso muito grande para suportar?
Teresa Almeida – Apesar de ser o sonho de todos os desportistas, de facto, não estava à espera de ser campeã do Mundo tão cedo. Sei que agora tenho muita gente a olhar para mim e a querer que eu conquiste mais títulos e sinto essa responsabilidade, mas acho que não vai ser prejudicial. Vai dar-me mais força para treinar e para continuar a lutar durante muitos mais anos. É um extra de motivação. Vou tentar não o encarar como um peso.
O que sentiu naquela sexta-feira, dia 12 de dezembro de 2014, na Playa Cavancha, na estância balnear chilena de Iquique, quando soube que tinha vencido a medalha de ouro no Mundial organizado pela Associação Internacional de Surf?
Eu estive sempre em primeiro lugar, desde o início da final, e, ao longo do tempo, ia sentindo o nervosismo a crescer e só olhava para o relógio para que o tempo passasse [risos]. Quando acabou, ouvi a buzina e vi toda a gente lá fora a gritar que eu era campeã, mas acho que bloqueei. Não me lembro do sentimento que tive na altura. Saí da água incrédula. Os meus colegas da Seleção levaram-me ao colo, estavam todos a gritar e eu não tinha reação, parecia que nem estava feliz [risos]. Só me ria! Mais tarde, quando cheguei ao hotel e fiquei mais tranquila, é que percebi o que tinha conseguido e, no dia a seguir, quando fomos cantar o hino e me entregaram a medalha, aí é que vivi mesmo a sensação e pensei: “Ok, eu ganhei e levo esta medalha para Portugal”.
Acreditou sempre na vitória?
Acreditei, sim. Eu tinha passado as meias-finais em primeiro lugar e isso deu-me imensa confiança. Quando se está numa final é para ganhar, mesmo que esse não seja o objetivo. Quando se está lá, só tem de se pensar em ganhar e foi nisso que eu pensei.
E resultou. Além da medalha, passou a ser a segunda atleta a trazer este título para Portugal, sendo que a primeira foi Dora Gomes, há 16 anos. Este facto histórico inspirou-a?
Quando se está ali, não se pensa nisso. Eu pensava na minha Seleção, que estava ali comigo naquele momento, nos meus companheiros e no meu título. E esse intervalo de 16 anos, de facto, é muito grande em relação à minha geração. Quando eu comecei a fazer bodyboard, a Dora já não fazia e, por isso, acabou por não ser uma referência muito presente na minha carreira. Tenho mais como referências a Catarina Sousa ou a Rita Pires.
Quando é que o bodyboard entra na sua vida?
Comecei quando tinha 13 anos. O meu primo já fazia e estava sempre a incentivar-me para fazer também. Quando fiz 13 anos ofereceram-me uma prancha. Isto foi em maio e, quando chegou o calor, comecei a ir com ele para o mar. A partir daí, nunca mais parei [risos].
Depois teve aulas?
Sim. No final desse ano inscrevi-me no clube da Nazaré e na Páscoa do ano seguinte comecei a competir com eles lá no clube, aos 14 anos.
Além de muito treino, é preciso ter o dom?
Penso que as pessoas nascem com mais ou menos jeito e eu sempre tive muito jeito para fazer vários desportos. Desde pequena que tenho habilidade para fazer várias modalidades. Não é bem um dom, mas é um jeito que se tem e que se vai melhorando.
Hoje faz do bodyboard profissão?
Neste momento, ainda não posso dizer que sou bodyboarder profissional, mas estou a trabalhar nesse sentido.
Enquanto desportista de competição, como é o seu dia-a-dia?
Sou licenciada em Ciências do Desporto e estava a tirar o mestrado em Educação Física, estava a estagiar, mas optei por deixar o estágio de lado e, neste momento, estou só dedicada ao bodyboard. Também dou aulas, além dos treinos, e é assim que se passam o meus dias: ou a treinar ou a dar aulas [risos].
E a nível de cuidados com o corpo e com a alimentação, é muito rigorosa?
Não tenho nenhuma dieta que leve à risca. Tento ter uma alimentação variada e saudável, não comer muito fast food e as coisas que, por norma, ninguém deve comer. A nível de treinos, tento sempre completar os meus treinos de bodyboard com a parte física. Corro e vou ao ginásio porque acho que isso é essencial no nosso desporto, para nos sentirmos bem e para prevenir algumas lesões.
Há mares complicados, como o da Nazaré, que bem conhece. Já apanhou algum susto?
Já apanhei vários [risos]. Como é normal, há sempre uma onda que às vezes não corre tão bem, mas são situações que ultrapassamos facilmente. Ao longo do tempo, a fasquia dos limites pessoais vai sendo colocada cada vez mais alto e o medo diminui e controla-se. Mas claro que existe sempre medo, o que até é bom porque faz-nos ter a noção dos riscos.
Percorreu um caminho difícil até chegar a este patamar?
É sempre difícil. É um processo que, ao longo dos dias e dos anos, exige muito de nós, requer muito esforço e dedicação. Mas acho que, por ser difícil, é que nos dá tanto prazer. Quando as coisas são fáceis de conquistar, acabamos por não dar o mesmo valor.
Existe preconceito em relação às mulheres no meio do desporto?
Não é bem preconceito, mas acho que se despreza um pouco o desporto feminino, no sentido em que não nos dão tanta visibilidade. Notamos muito que nas competições, pelo menos nas de bodyboard, em que os nossos campeonatos decorrem ao mesmo tempo que os dos rapazes, nós acabamos sempre por entrar quando estão as piores condições… eles optam sempre pelas melhores marés e as raparigas ficam com as sobras. Acabamos por notar um pouco essa “discriminação” e um menor cuidado.
E alguma vez sentiu a sua feminilidade diminuída por praticar este desporto?
Não. Hoje em dia, as raparigas que fazem desporto cuidam da imagem e conservam o lado mais feminino. Nunca senti isso. Acho que os rapazes até acham sexy uma mulher que faz desporto de competição [risos].
Falávamos há pouco do preconceito para com as mulheres. Agora, pergunto-lhe em relação a Portugal. Sente que os desportistas portugueses são respeitados lá fora?
Penso que, cada vez mais, lá fora sabem que nós temos potencial, tanto de ondas como de atletas. Sempre nos viram como ótimos competidores e acho que, hoje em dia, também nos temem pelo surf que temos e já começam a ver que temos qualidade. Há muito respeito por Portugal lá fora.
A sua família sempre apoiou este sonho ou foi complicado aceitarem que ia dedicar a vida ao mar?
Quando iniciei não o levavam tão a sério. Mas este último ano foi de transição: comecei a ganhar mais títulos, a viajar mais e a dedicar mais tempo ao bodyboard. E, como já falei, foi também o ano em que tive de pôr o mestrado de lado. Foi aí senti que tinha, realmente, o apoio deles, porque não se opuseram e deram-me a oportunidade de fazer o que eu queria e o que achava melhor para mim. Acho que tomei a decisão correta e eles também ficaram super contentes com o que conquistei. Só posso agradecer o apoio deles. Da minha família e da minha equipa.
Diz que no último ano viajou muito. Como é gerir a distância da família, dos amigos, do namorado, da rotina no seu País?
Nós viajamos para fazer o que gostamos e as pessoas que ficam apoiam-nos e compreendem-nos. Por isso, é fácil, não há nenhum problema nesse aspeto.
Mas pensa no dia em que tiver de parar e, talvez, constituir a sua própria família?
Claro que, daqui a uns anos, esse é um dos planos. Quando deixar de competir, ou mesmo continuando a competir, porque é uma coisa que dá para conciliar. É um dos sonhos.
Depois de um ano como o de 2014, em que começa por ser vice-campeã da Europa, em Marrocos, e acaba a ser campeã mundial no Chile, o que espera de 2015? O que pode ser melhor?
De facto, 2014 foi um ano muito bom, o melhor de sempre, talvez [risos]. Acho que não podia pedir muito mais. Agora, em 2015, só quero que tudo corra bem e, acima de tudo, quero evoluir, porque sei que ainda tenho muito para trabalhar e aprender. Manter-me lá em cima vai dar muito trabalho. Cheguei lá agora, mas posso não voltar a atingir tão depressa o que atingi. E é isso que me vai dar motivação para treinar o resto do ano.
Qual é a próxima etapa?
Agora, ambiciono o Circuito Mundial, que começa em maio. Se tiver os apoios necessários é o que vou fazer. Até lá, é treinar. Em princípio, vou agora em fevereiro para o Havai para treinar muito. Depois, começam as competições europeias e nacionais e, aí, já tenho de estar preparada.
Diz que ser mãe é um dos seus sonhos. Mas qual é o seu maior sonho?
Para já, o meu sonho é andar pelas melhores ondas do mundo, correr o Circuito Mundial e, quem sabe, conseguir outra vez ser campeã do Mundo [risos].
Texto: Laura Ribeiro Santos; Fotos: Luís Baltazar; Produção: Romão Correia; Cabelo e maquilhagem: Vanda Pimentel com produtos Maybelline e L’Oréal Professionnel
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