Cinco décadas depois de iniciar a carreira, e após já ter sido considerado “morto” para a música por diversas vezes, o cantor de Mogofores não podia estar em melhor forma.
Na verdade, José Cid talvez esteja no seu melhor momento de sempre: no último verão, terá sido dos artistas com mais trabalho, tanto em número de espetáculos como de espetadores a assistirem a atuações que, não raro, ultrapassavam as três horas ininterruptas em cima dos palcos; tem um projeto de jazz (Acid Jazz Project) que lhe dá muito prazer; o seu álbum de rock progressivo de 1978, 10 000 Anos Depois Entre Vénus e Marte, foi considerado por uma revista da especialidade o quarto melhor álbum de sempre daquele género musical e vai tocá-lo (na íntegra e com alguns velhos amigos…) no próximo dia 15 de novembro no Coliseu de Lisboa; tem dois novos discos prontos a sair, um deles já no início do próximo ano e o outro, de rock sinfónico, previsto para pouco depois; está na génese de um novo partido político; e, por último, mas não menos importante – antes pelo contrário… –, encontrou a estabilidade emocional com o casamento celebrado nas Maldivas há três anos, com Gabriela Carrascalão, um amor de há 31 anos atrás…
VIP – Como explica o sucesso que tem cada vez mais, quando outros artistas de nomeada acusam os efeitos da crise?
José Cid – Para já, baixei imenso os meus preços; depois, levo grandes multidões aos espetáculos sem forçar ninguém a ir atrás de mim. Cada concerto meu é completamente abrangente e transversal, porque é para todas as gerações, com grandes canções que o público conhece, com um grande som e comigo ainda a cantar, não a 100 por cento, como quando estava no meu auge, mas a 85 por cento… Não tenho os mesmos agudos que tinha, mas tenho muitos agudos ainda para dar e preservei a minha voz, porque não fumo, não bebo álcool…
A Gabriela é bisneta da última rainha de Timor e o José Cid tem dois títulos heráldicos…
Tenho, mas não os uso. É completamente ridículo puxar de galões a esse nível. Além de que os títulos já não são meus; sou apenas representante desses títulos, o que é diferente. Por linha varonil, sou eu o representante dos títulos, mas não faço questão de ser… Seria completamente ridículo eu dizer: “respeitinho porque eu sou o Barão do Cruzeiro ou o Visconde dos Lagos”. Desatava tudo a rir à gargalhada!
Qual a sua opinião sobre a monarquia? Faz sentido, na atualidade?
Claro que sim, porque os países mais cultos, mais civilizados, com menos crises, com menos offshores, com menos corrupção, são as monarquias do Norte da Europa; é só essa a via que temos de seguir. Os Presidentes da República gastam infinitamente mais do que os reis de Espanha. As famílias reais são muito mais humildes, muito mais simples. As monarquias, hoje, não são pela nobreza, são pelo povo, democráticas e muito mais cultas e equitativas. Pode-se pagar muitos impostos, mas tem-se tudo facilitado na vida enquanto que, em Portugal, pagamos impostos faraónicos e não temos nada facilitado. Quando digo nada facilitado, estou a falar de saúde ou da educação dos nossos filhos ou netos. Portanto, para onde é que vai o dinheiro que entregamos ao Estado? Não temos resposta. Porque todos os políticos republicanos que estão a dominar este País são completamente arrogantes, anticulturais, incentivam cenários medonhos em termos económicos, protegem empregos e lugares de pessoas em situações de decisão, a todos os níveis, que não têm habilitações para isso, mas que são amigos desses mesmos políticos.
Entretanto, dá a cara por um novo partido político, o Nós, Cidadãos, ao lado de figuras como Rui Rangel, António Capucho, Mendo Castro Henriques ou o general Garcia Leandro. Como é que está a formalização do partido?
Não se debateram ainda ideias, o que eu acho mau, mas ainda não nos reunimos para debater ideias… Já me fizeram algumas perguntas: se era um partido de direita, de esquerda ou do centro… Eu não estou nada entre o PS e o PSD, nem estou interessado em estar. O que eu gostaria era de convencer as pessoas que não votam a tomarem a decisão de votar. E essas são 50 por cento, ou mais, das que não votaram para as eleições. São essas pessoas que é preciso chamar à razão. Não o Presidente da República vir dizer, vagamente, “não se esqueçam de ir votar amanhã”… Isso não é solução! É mobilizá-las de outras formas. Este partido não está nem à esquerda, nem à direita, nem é de partido nenhum, muito menos do PS ou do PSD. A minha ideia é que este partido devia estar “por cima”, para idealizar, e “por baixo”, para apoiar as pessoas mais carenciadas. Os partidos existentes são arrogantes em relação às pessoas: quando há uma greve, os trabalhadores não são ouvidos. O 25 de Abril é um sistema que falhou, porque aumentou enormemente a pobreza deste País, não soube diminuí-la, não soube obrigar a riqueza a ser protegida, a continuar a criar riqueza e a saber dividi-la. A riqueza que foi criada em Portugal está toda lá fora, em offshores, e desbaratámos completamente a classe média. Os políticos têm medo da cultura. É impensável que Portugal não tenha um Ministério da Cultura, não tenha um Ministério do Turismo. Os espanhóis já perceberam isso há muito tempo; as monarquias têm outros conceitos sobre tudo. Estão mal, têm crise, mas saem da crise mais depressa do que nós. Nós ainda vamos beneficiar da saída da crise em Espanha… E, no entanto, o nosso povo é infinitamente melhor do que o povo espanhol.
É incontornável falar na foto que fez nu, apenas com um disco de ouro à frente. Disse que o fazia por se estar a bater pela música portuguesa, contra um fenómeno recente, na altura, que eram as playlists das rádios. Valeu a pena? Mudou alguma coisa? As playlists implantaram- se definitivamente nas rádios…
Passados estes anos todos, eu toco muitíssimo pouco na rádio, mas os meus discos vendem e as pessoas querem ir ver-me ao vivo. Há rádios que têm destruído canções. Há canções que já não se conseguem ouvir na rádio, por passarem constantemente. As músicas são extraordinárias, deveriam passar com moderação nas rádios, mas são de tal maneira passadas, como clisteres, que fartam. E, depois, os mesmos álbuns têm músicas espetaculares que não são passadas, em detrimento de uma única. Já não se diz quem é que escreveu, quem é que compôs, já não se fala de poetas, de músicos, de produtores, raramente se diz de quem é a canção…
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