Lia Gama foi convidada de Daniel Oliveira no “Alta Definição”, neste sábado, dia 29 de outubro. A atriz, de 78 anos, não deixou nada por dizer ao apresentador e aos telespectadores da SIC. Nesta conversa, o conhecido rosto do teatro e das telenovelas falou sobre a família, sobre amores e sobre a profissão, sempre com a garra e a intensidade que a caracterizam.
Um dos temas mais marcantes esteve relacionado com a difícil relação de Lia Gama com o pai.
“Eu sou aquilo que sou porque tracei o meu caminho. Sou o que sou penso que a mim o devo”, começou por dizer. “Com quatro anos fui viver com o meu pai e com a minha madrasta. Não tenho memórias gratificantes, não tenho. Até ao principio da adolescência lembro-me de muito pouco, Ou se calhar não me quero lembrar.”
Questionada por Daniel Oliveira sobre o motivo pelo qual foi viver com o pai e com a madrasta aquando a separação dos progenitores, a atriz explicou: “no fundo os meus pais nunca viveram propriamente juntos (…) O meu pai era um valdevinos.”
“Houve alturas em que não se sentiu desejada?”, perguntou o apresentador. “Até recomeçar a relacionar-me com a minha mãe, já tarde, não tinha ideia disso. Tinha umas saudades infinitas da minha mãe. Mas quando a reencontrei foi uma desilusão. Coitada da minha mãe, sofreu imenso, era uma mulher sofridíssima. A minha mãe ficou com o meu irmão, foi uma lutadora à maneira dela. Se calhar achou que eu ficava melhor acolhida com o meu pai, com menos dificuldades”, adiantou Lia Gama. “A minha madrasta dizia-me muitas vezes ‘ninguém te quer’. Não foi uma infância feliz, não.”
Lia Gama sobre o pai e a madrasta: “Um dizia mata, outro dizia esfola”
De seguida, explicou o pesadelo que viveu, sobretudo por causa da má relação com a mulher do pai. “Eles davam-se muito bem. Um dizia mata, outro dizia esfola. Eu levava duas vezes por coisas que às vezes nem tinha feito. Era o bobo da festa. O meu pai era mais violento do que ela. Vivi sem afetos, o que é péssimo para uma criança. Por isso sou como sou: sou muito insegura, não parecendo. Digo tudo o que tenho a dizer.”
“Acreditava no amor do seu pai por si?”, quis saber Daniel Oliveira. “Não, nada!”, afirmou a atriz. “Sentia que era um empecilho. A minha madrasta dizia que gostava mais de rapazes, que tinha preferido ficar com o meu irmão. Eu era rebelde, nunca me acomodei. Quanto mais me batiam, menos eu chorava.”
Lia Gama contou ainda alguns episódios que a marcaram profundamente. “Eu era tão agredida, fisicamente, que as vizinhas fizeram uma carta anónima para o tribunal de menores. Eles foram julgados e absolvidos. Eu fui interrogada, várias vezes, fiz vários exames no instituto de medicina legal e eu nunca os denunciei. Lembro-me de uma vez ter levado uma sova monumental porque tinha passado para a terceira classe, tinha uns livros novos e uma pasta nova, eu tive de sair, deixei tudo em cima da cama e o cãozinho destruiu aquilo tudo. Meti tudo na pasta, que era nova, fechei-a à chave. Um dia, a minha madrasta chegou a casa, descobre a pasta fechada, abriu-a e descobriu aquele preparo. Levei com cinto, verdasca de marmeleiro, era de toda a maneira. Só me lembro da minha madrasta dizer: ‘não lhe batas na cabeça’.”
Durante estes anos, Lia Gama viu a mãe e o irmão de forma muito esporádica. A atriz revelou ainda que, já depois de ser atriz, o pai lhe pediu várias vezes desculpa: “antes de morrer, ele disse-me que realmente não tinha sido bom pai. Eu disse-lhe que ele podia ir em paz, porque se ele tivesse sido bom pai eu não era aquilo que sou. Atriz, por exemplo.”
Lia Gama sobre o futuro
Daniel Oliveira terminou a conversa com uma pergunta: “Quando olha para o seu futuro o que é que vê?” Lia Gama respondeu: “É curto. Vejo amanhã. Só não queria doenças, não queria estar doente. Queria morrer rápido, não era devagarinho. Era depressa”, rematou.
Texto: Joana Dantas Rebelo; Fotos: Arquivo Impala
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