Júlio Isidro usou as redes sociais para recordar um Natal que passou na prisão. Não, o apresentador não esteve preso… mas apresentou a festa natalícia de um estabalecimento prisional e relatou a experiência na sua página oficial de Facebook, num texto a que chamou “Natal detido e sentido”.
“Foi há 39 anos. Um telefonema do director da cadeia de Sintra… senhor Júlio Isidro, gostava de o convidar para a festa de Natal do nosso estabelecimento prisional… Engulo em seco e lembro-me dos concertos nas prisões de Johnny Cash… tenho muito….. gosto… mas qual é a minha participação? Era para animar a festa dos nossos reclusos apresentando os UHF e o D. Vicente da Câmara… vamos buscá-lo onde quiser”, começou por contar.
Júlio Isidro, que teve covid-19 recentemente, recordou aquele dia 15 de dezembro de 1981. “Estava a entrar num Mercedes conduzido por um guarda, já vinha o D.Vicente com a caixa da sua preciosa guitarra segura entre as pernas. Chovia, chovia muito, e lá chegámos ao território onde gente condenada a um Natal entre muros, nos aguardava”, escreveu, continuando: “O refeitório com um palco montado ao fundo, estava à cunha, a humidade, o calor dos corpos e o fumo dos cigarros, fazia do ar um nevoeiro de ruelas londrinas.”
“Subi ao palco entre aplausos e vivas que quase me emudeceram. Falei do Natal e segui em terrenos de humor com umas piadas brejeiras q.b. até apresentar os UHF. Grande concerto do António Manuel Ribeiro e seus pares, onde fui metendo umas larachas para animar, ainda mais, a malta. Agora a minha função era sair do rock para o fado. Tudo fácil porque o público estava aberto a tudo”, disse, lembrando ainda a emoção que sentiu quando ouviu D. Vicente cantar, com os olhos “molhados de água”.
A ida à casa-de-banho
O espetáculo terminou. “Gritei Boas Festas para todos, sem saber bem o que são estas quadras limitadas no espaço e no tempo”, confessou Júlio Isidro neste mesmo texto. “Saí por entre os espectadores que me saudavam, muitos com palmadas nas costas, algumas fortes…. Ganda Júlio, és o maior… dás na televisão e na rádio… até um dizer a brincar…tira-me daqui”, disse, acrescentando que, à porta do refeitório, a direção do estabelecimento prisional os aguardava para agradecer.
Nesse momento, Júlio Isidro pediu para usar a casa-de-banho. “Talvez por descuido, o guarda que me levou ao espaço das necessidades, indicou-me o urinol dos reclusos! Estavam lá alguns e a atmosfera ainda mais pesada de odores”, lembra. “Senti algum desconforto, assim como que uma quebra de tensão”, confessou.
Já no regresso a casa, o apresentador teve uma ‘quebra’ devido a todas as emoções que experienciou nesse dia: “Foi a meio do percurso que o meu estômago não resistiu às emoções vividas. Pedi ao condutor para parar e ali mesmo na berma da estrada… foi tudo fora”.
“O tudo não era nem um croquete ou um folhado de salsicha que não tinha comido. Saía de mim a angústia do que será a liberdade quando a perdemos”, afirmou, dizendo ainda que, ainda hoje, não esquece esse dia: “Passados 39 anos, sinto na memória o ar que respirei numa tarde solidária, onde fomos recebidos com evidente gratidão de todos. Esse Natal numa prisão, como tantas dezenas de outros vividos em hospitais, onde estive em frente de gente a sofrer, a dor é comum… a vida está lá fora e nós aqui. Sonho a utopia de que um dia exista uma sociedade de portas abertas à felicidade.”
Texto: Patrícia Correia Branco; Fotos: Impala
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