Globos De Ouro
Os discursos feministas que emocionaram e marcaram a noite

Internacional

Oprah Winfrey pôs toda a gente de pé com o seu discurso contra «os homens poderosos e brutais». Mas não foi a única a condenar os abusos contra as mulheres.

Seg, 08/01/2018 - 11:39

A 75ª edição dos Globos de Ouro foi a primeira cerimónia da indústria cinematográfica desde que estalou a vaga de denúncias de assédio e abuso sexual envolvendo produtores e atores de Hollywood. Estes prémios de cinema e televisão atribuídos pela Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood (HFPA) ficarão para a história, não tanto pelos vencedores, mas pela condenação pública destes crimes de que são alvo as mulheres.

O protesto começou logo na passadeira vermelha, que, nessa noite, se vestiu de negro. Depois vieram os discursos sentidos e poderosos como o de Oprah Winfrey, que conseguiu por o auditório de pé.  A apresentadora de televisão ganhou o prémio carreira Cecil B DeMille. Foi a primeira mulher negra a vencer este galardão. O seu discurso foi contra «os homens poderosos e brutais» que dominaram o mundo, afirmando que «o seu tempo chegou ao fim».

Mas não foi a única a discursar contra o machismo e o assédio sexual. Também as atrizes Nicole Kidman e Laura Dern marcaram a sua posição e apelaram à igualdade de direitos e de representação para as mulheres.

Oprah Winfrey

«O que sei com toda a certeza é que dizer a verdade é a arma mais poderosa que todos temos e sinto-me especialmente inspirada e orgulhosa por cada mulher que teve a coragem de falar e partilhar a sua história», começou por Oprah.

«Este ano, nós tornámo-nos a história. Mas não é apenas a história da indústria cinematográfica. É uma história que transcende qualquer cultura, geografia, raça, religião, política ou local de trabalho», prosseguiu, afirmando que os abusos no sector, tornados públicos em 2017, são a história de muitas mulheres «cujo nome nunca se conhecerá»

«Esta noite, quero expressar a minha gratidão a todas as mulheres que aturaram anos de abusos e assédio, porque, tal como a minha mãe, têm filhos para alimentar e contas para pagar e sonhos para perseguir», disse. «São trabalhadoras domésticas, que trabalham em fábricas e restaurantes, em engenharia, ciência, em política e são parte do mundo tecnológico, são atletas nos Olímpicos e militares», apontou.

«Durante demasiado tempo, as mulheres não foram ouvidas e eram desacreditadas se ousassem falar a sua verdade contra o poder desses homens, mas o tempo deles acabou», sublinhou. «Time’s Up» (Acabou-se o tempo), repetiu Winfrey, usando o lema que designa o recém-criado fundo lançado por mais de 300 mulheres poderosas de Hollywood destinado a ajudar mulheres menos privilegiadas a defenderem-se de possíveis abusos sexuais no local de trabalho.

«Há um novo dia no horizonte e quando esse novo dia finalmente nascer, será por causa de muitas mulheres magíficas, muitas das quais estão aqui nesta sala, e por muitos homens fenomenais, que lutam para nos conduzir ao momento em que mais ninguém tenha de dizer ‘Me too’», concluiu.

A também produtora e empresária recordou ainda quando, em criança, assistiu pela televisão a cerimónia dos Óscares que Sidney Poitier venceu com o Óscar de Melhor Ator (o primeiro negro a receber tal prémio). O mesmo Sidney Poitier que viria a ser distinguido também com o Cecil B. DeMille nos Globos de Ouro de 1982. «Tentei muitas, muitas vezes explicar o que aquele momento significou para uma menina, para uma criança que estava a ver a cerimónia enquanto a mãe chegava a casa cansada de limpar a casa dos outros», confessou. «Tenho para mim que, neste momento, haverá alguma menina a ver-me transformar na primeira mulher negra a receber este mesmo prémio», afirmou Oprah, que dedicou o galardão a essas crianças e mulheres que levantaram a sua voz contra abusos e injustiças.

Nicole Kidman

A australiana venceu o prémio de Melhor Atriz de minissérie pelo seu papel em «Big Little Lies». A atriz interpretou Celeste, uma mulher formada em advocacia, com dois filhos, sem problemas económicos e casada com um homem mais jovem, com uma vida perfeita aos olhos de todos. Mas dentro de casa, era vítima das agressões do marido. A série tem sete episódios e é apenas no sexto que a personagem de Nicole Kidman decide pôr um ponto final às agressões.

No seu discurso de vitória, Nicole agradeceu a várias pessoas, muitas delas mulheres, incluindo as suas colegas de casting neste trabalho, e classificou-as de «Power Women» (Mulheres Poderosas). Depois condenou os abusos sobre mulheres. «Esta personagem que interpretei representa algo que está no centro do debate neste momento: o abuso. Acredito e espero, que podemos motivar mudanças através das histórias que contamos e pela forma como as contamos. Não vamos deixar este assunto morrer.» 

Laura Dern

Laura ganhou o prémio de Melhor Atriz Secundária com a sua personagem Renata Klein na série «Big Little Lies». E no seu discurso também apelou ao fim do silêncio: «Muitas de nós fomos ensinadas a não bisbilhotar. A cultura do silêncio estava instalada. Incentivo todos nós a não apoiarmos apenas os sobreviventes que são suficientemente valentes para contar a sua verdade, mas também a promover uma justiça reconstrutiva. Também devemos protege-los e dar-lhes trabalho. Devemos ensinar aos nossos filhos que falar sem medo de represálias é a nossa estrela da nossa cultura.»

Texto: Inês Neves | Fotos: Reuters

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