No escritório onde é maquilhada para a produção da VIP, Leonor Freitas tem fotografias de família, garrafas de vinho e uma mesa de trabalho cheia de papéis. Enquanto lhe põem o rímel, aproveita para fazer telefonemas a pedir para responder a e-mails. Leonor, 62 anos, não consegue estar parada. “Esqueço-me da idade que tenho”, diz, divertida. Entra no escritório às 8h da manhã, mas nunca tem hora para sair. “Às vezes é às 22h, outras vezes às 23h, nunca há uma hora certa. E depois vou o caminho todo para casa a ralhar comigo.”
Não era uma vida no campo que os pais tinham sonhado para a filha. Na altura, as crianças estudavam até à quarta classe e, se eram meninas, prosseguir os estudos estava mesmo fora de questão. Com Leonor foi diferente. Estudou em colégios em Lisboa e em Setúbal, só ia a casa ao fim de semana ou nas férias, e acabou por se formar em Serviço Social. Aos 15 anos, disse ao pai que queria fazer o curso de Regente Agrícola e a resposta foi peremptória: “Isso é um curso para homens, não vais.”
Mas é, curiosamente, num mundo ainda de muitos homens que Leonor encontra a sua verdadeira vocação. Estava a trabalhar na Administração Regional de Saúde de Setúbal quando o pai morreu. A quinta estava há várias gerações na família. Primeiro como casa agrícola, depois com a cultura de trigo e de milho, a seguir chegou a ter um rebanho de ovelhas e produção de queijos. Só mais tarde vieram as vinhas e o vinho vendido a granel. Com a morte do pai, põe-se uma questão em cima da mesa: vender o património ou arregaçar as mangas? “Cada vez que pensava em vender, arrepiava-me toda e, por isso, não foi difícil tomar uma decisão. A minha avó já estava com 90 anos e a minha mãe precisava de ajuda.” Ainda conciliou por uns tempos o trabalho na área da saúde com o da quinta, mas depois percebeu que adorava a vida na terra. “Descobri que adorava isto, que era aqui que me encontrava.”
A Casa Ermelinda Freitas, nome da mãe de Leonor, começa a ganhar os contornos que hoje a tornam um caso de sucesso. O vinho deixou de ser vendido a granel em 2002 e 13 anos depois já conquistou mais de 600 prémios em todo o mundo. Na adega trabalham 34 pessoas, nas vinhas há alturas que chegam a ser mais de 100. É com emoção que Leonor olha para trás. “A minha vida deu uma reviravolta. Deixei de ter férias, fins de semana, mas tenho ganho muito, muito mesmo. E quando penso na evolução… As reuniões eram na sala de jantar da casa da minha mãe, como não havia escritório, pusemos um computador no hall de entrada. Cada vez que me lembro como tudo foi…”
Os prémios trazem mais responsabilidade a Leonor Freitas e, acima de tudo, à sua marca. “Sempre que as pessoas virem um rótulo Ermelinda Freitas têm de saber que é a melhor relação qualidade/ preço”, diz. E qual é o segredo do sucesso? “A família que tive e tenho, a minha equipa de trabalho e os consumidores. E depois é a humildade, é acreditar em mim própria, é ser confiante e coerente, é transformar as coisas más em coisas boas. Sempre fui muito positiva, fui habituada a lutar e continuo a fazê-lo. Normalmente, deito- me cansada, mas feliz.”
O telemóvel não para de tocar e há muitos e-mails para responder. Leonor ainda não almoçou, mas o seu sorriso não esmorece por isso. Tem tantos sonhos para pôr em prática. O seu vinho já está em várias partes do mundo, mas, para uma mulher com a garra de Leonor, o céu é o limite. “Continuo com muitos projetos para concretizar. Quando cheguei aqui sei que ninguém acreditava que isto ia dar certo, eu era a menina que tinha saído para estudar, agora as pessoas já acreditam em mim, já tenho margem para errar.”
Conheça aqui mais mulheres de sucesso portuguesas.
Texto: Mónica Menezes; Fotos: Luís Baltazar; Produção: Romão Correia; Cabelos e Maquilhagem: Vanda Pimentel com produtos Kioma e L’Oréal Professionel
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