É conhecido por muitos como o maestro simpático de penteado radical, mas Rui Massena, atualmente jurado do programa Got Talent, tem, aos 42 anos, uma carreira pautada por várias partituras. Entre outros, foi diretor artístico da Orquestra Clássica da Madeira durante mais de uma década, programador da área da música de Guimarães 2012 – Capital Europeia da Cultura, maestro da Fundação Orquestra Estúdio, passou por vários projetos musicais e programas televisivos. Agora, sentiu a necessidade de escrever as suas próprias palavras, que ficaram materializadas nos 15 temas de Solo, o primeiro trabalho de originais e que podem ser ouvidas nos concertos dia 16 de abril, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, e a 19 de abril na Casa da Música, no Porto.
VIP – Quando soube que queria enveredar pelo caminho da música?
Rui Massena – Desde os seis anos que estudo Música, mas apenas com 20 é que decidi torná-la profissão. Cheguei a fazer o primeiro ano de Direito, mas percebi que não era para mim.
E porquê a direção de orquestra? Quando era adolescente, não preferia a ideia de ter uma banda de rock, que de resto chegou a ter?
Foi naturalmente. Aos 14 anos tive uma banda de originais, mas para um estudante de Música que toca piano fluentemente, estar atrás de um teclado a fazer meia dúzia de notas não era para mim, nem para o meu pai que não gostava do ambiente dos concertos… A direção de orquestra vem na sequência de vários anos a dirigir coros e orquestras escolares. O gosto de trabalhar com pessoas era tão forte que encontrei a minha vocação dentro da música.
Lança agora o seu primeiro trabalho em nome próprio. Sentiu que chegou o momento?
Completamente. Desde adolescente que gosto de compor, mas nunca soube acreditar nesse lado da criação. Julgo que, vividos estes 15 anos como diretor de orquestra e com tantos projetos que me passaram pelas mãos, senti a segurança para me aventurar neste caminho. Um maestro é um gestor ao serviço de uma obra musical, um intérprete rigoroso das palavras do compositor. Eu quis escrever as minhas próprias palavras. A necessidade de materializar o Solo tem que ver com uma necessidade pessoal.
O que o impediu de o fazer antes?
Talvez o conhecimento dos grandes compositores tenha atrasado o meu processo criativo. A tendência é acharmos que qualquer composição não tem a qualidade desejável. Só agora é que não me importo com a simplicidade das minhas canções e até a desejo. Não quero ficar na história da música, apenas na vida e memória das pessoas que gosto.
O que espera dos concertos que aí vêm?
Espero tirar o máximo de prazer de um momento que tanto quis e que o público se sinta muito satisfeito por ter investido o seu tempo para ir ao concerto.
Afirmou que a conceção deste álbum lhe permitiu um reencontro consigo. Como músico ou como ser humano?
Ambos. Como músico, no sentido da criação. Deu vida ao meu mundo imaginário e voltou a trazer o piano para a minha vida. Como homem, foi um reconhecimento de mim próprio. Quando se trabalha regularmente com muitas pessoas, a tendência é para desenharmos a personalidade em função dos projetos. O exercício da liderança é muito cansativo porque implica muita tolerância. A Capital Europeia da Cultura, apesar do sucesso, foi muito violento em termos de organização. No fim estava a precisar de me reconhecer, ter tempo para mim e para a minha família. Necessitei de viajar, ler, estar em casa…
O seu processo criativo é solitário? Pergunto isto porque esteve em Alfandega da Fé…
No geral é solitário, preciso do silêncio para o poder encher de som. Alfandega da Fé foi uma escolha. Queria um disco sob o signo da tranquilidade e serenidade. A neve e o frio são inspiradores. As gentes são particularmente sinceras e a cidade recebeu-me muito bem. Estou certo que muita da tranquilidade do disco se deve também a um bem-estar pessoal.
Conseguiu levar a família consigo ?
Não. Estive com o Mário Barreiros e o Manuel Macedo a gravar, mas, apoiado pela Rent-a-Star, tive oportunidade de viajar muitas vezes para estar com a família. Mesmo não sendo o mais importante, as condições que rodeiam os projetos afetam o bem-estar das pessoas.
Consegue que a sua mulher, e agora os seus filhos, vão atrás dos seus projetos?
Fazemos tudo no melhor interesse de todos. O amor vem primeiro, a seguir os projetos que às vezes ocupam muito espaço. A minha mulher [Clara Coelho] é médica, o que a faz estudar, preparar trabalhos e exercer. Vamos atrás uns dos outros. Mas tenho muito apoio. Sem a minha mulher, o caminho teria sido muito diferente.
É, seguramente, o maestro “mais televisivo” de Portugal. A “caixinha mágica” atrai-o?
Muito. Preciso muito de comunicar.
Como está a correr o Got Talent? Portugal tem de facto talento?
O problema de Portugal não é a falta de talento, é a estruturação da criatividade, a criação de estruturas intermédias capazes de ir aumentando a capacidade de se viver das artes com dignidade. O programa é muito interessante porque aceita a diversidade e não tem limite de idade.
O que o faz aceitar estes projetos?
Gosto de sair do meu mundinho. Isso tira-me das partituras, dos livros, daquele mundo protegido. Estas incursões permitem-me conhecer a sociedade e de alguma forma contribuir positivamente para a melhorar. Acredito no entretenimento rodeado de criatividade e não estupidificador.
Acha que o programa Música Maestro conseguiu de facto cumprir o objetivo de aproximar a música clássica do grande público?
Sim, pelo menos o retorno que eu tenho das pessoas é esse. A música erudita é para todos, da mesma forma que Eça de Queirós ou Hermann Hesse são para todos. O que tem de ficar claro é que, quanto mais se conhece, mais se gosta.
Os seus filhos gostam de música clássica?
Os meus filhos gostam de música. A música tem contextos. Quando ouvem um concerto sinfónico, estão sentados a ouvir. Quando ouvem a Violetta, podem estar no Ipad ou a falar para o lado. Gosto que eles saibam ter prazer nos vários contextos. O principal para mim é que aprendam a ler e a tocar, para terem um prazer a mais na vida.
Proibiu o mais velho de participar no programa. Por que razão?
Foi no The Voice. Queremos que eles cresçam no seu tempo, ao seu ritmo. Uma estrela aos 11 anos altera a relação com os amigos, com a família, com a escola e, sobretudo, com eles próprios. Mas há crianças e crianças.
Que tipo de pai é? “Desalinhado” como parece ou desalinhado só mesmo o penteado?
Acho que sou um pai bastante afetivo e com humor. De resto, procuro ser o melhor possível.
Onde é que ainda quer arriscar? Quais são os seus projetos?
Estou cheio de sonhos. Para estar bem preciso de seguir o que sinto. E assim faço.
Texto: Elizabete Agostinho; Fotos: Luís Baltazar; Produção: Romão Correia; Maquilhagem e cabelos: Ana Coelho com produtos Maybelline e L'Oréal Professionnel
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