Mourinho Rockstar
Autor do livro revela as duas faces do polémico treinador

Famosos

“Mourinho traça o seu caminho, como um marginal”, diz Luís Aguilar

Qua, 24/09/2014 - 23:00

Luís Aguilar, o autor do livro Mourinho Rockstar, explica como surgiu a ideia de mostrar as duas faces de José Mourinho, o treinador mais polémico do mundo e o que foi encontrando ao longo da sua pesquisa
 
VIP – Como e quando surgiu a ideia de fazer este livro?
 
Luís Aguilar – Surgiu em 2011 quando a edição espanhola da revista Rolling Stone elegeu Mourinho como a rockstar do ano. Justificaram essa decisão pela «arte maquiavélica que Mourinho tem de exasperar toda a gente». Logo nessa altura achei interessante a analogia entre Mourinho e uma rockstar.  Na verdade, o futebol já foi muito mais rock ´n rol do que é hoje. Como na década de 80 e início da década de 90. Esse espírito politicamente incorreto, rebelde, foi muito bem representado por homens como Cantona, Romário ou, antes deles, o brasileiro Sócrates. Mas com o tempo esses homens foram desaparecendo. Ficaram apenas os meninos de coro. Os rapazes que dizem sempre tudo da mesma forma. O rock foi progressivamente substituído por uma pop plástica. Por um sistema fast food onde todos dizem a mesma coisa e onde parece quase proibido pensar pela própria cabeça. Mourinho é a antítese desta tendência. Recupera a rebeldia de outros tempos. Traça o seu caminho, com as suas regras, como um marginal dentro desta nova indústria do futebol. Mas vence. Tem sucesso. Deixa a sua marca por onde passa. É um dos poucos homens rock do futebol atual. Além  dele temos Klopp (treinador do Dortmund) e jogadores como Ibrahimovic. Não há muitos mais. É pena que sejam tão poucos. Mas felizmente ainda temos Mourinho para nos animar. 
 
Porquê nesta altura?
 
Anteriormente estive a escrever outros livros e não pude agarrar no trabalho assim que a ideia surgiu. Por isso só o fiz agora. Além disso, também quis esperar pelo fim da aventura no Real Madrid para poder ter um ângulo de abordagem mais alargado. 
 
Mourinho tem mesmo duas faces?
 
Mourinho, como muitos outros protagonistas do futebol, teve de criar uma personagem que lhe permita viver e vencer numa indústria cruel com os que não ganham como é o futebol. Assume uma face combativa enquanto treinador. Alguém atento a todos os pormenores que nunca deixa os adversários sem resposta. Utiliza alguma acidez e arrogância para defender os seus e tentar destabilizar os adversários. As duas faces, aqui, não surgem no sentido de dizer que é um homem com duas caras. Não o acho falso enquanto treinador e líder. Mas não é um anjinho, nem poderia ser. Os anjinhos não sobrevivem no futebol de alta competição. Acredito, no entanto, que seja um tipo muito mais tranquilo na sua casa, com a sua família. Um homem que está em paz e que aprecia o seu sossego. Quase como o lar onde o guerreiro descansa entre cada uma das batalhas da profissão. A ideia das duas faces vem daí. Mas não acontece apenas com Mourinho. Acontece com todos nós. É natural que sejamos diferentes no trabalho e com a família. É natural que nos sintamos mais à vontade com os nossos, na nossa casa, do que no trabalho. A diferença é que Mourinho criou uma personagem com pimenta. Um autêntico showman. Uma imagem que o ajuda a vender e a vencer. Sem dúvida que é das personalidades mais fascinantes do futebol atual. 
 
Explique este livro em duas frases.
 
É um livro que retrata Mourinho como uma rockstar do futebol, um anti-herói dos tempos modernos – ao estilo de Doutor House, Dexter ou dos anti-heróis do universo de Tarantino – retratado por aqueles que privaram com ele, sejam os que o admiram ou os que não o suportam. É um livro sobre um homem que não provoca indiferença e tem uma personalidade forte e única numa indústria cada vez mais uniformizada e desinteressante fora do campo. Com Mourinho isso nunca acontece. Algumas das suas conferências de imprensa são mais emocionantes do que certos jogos. 
 
Por que é que Mourinho é Especial?
 
Porque vence. Porque não deixa que o pisem. Porque não tem medo de criticar os poderosos quando se sente prejudicado (como aconteceu com o caso da Bola de Ouro da FIFA). Porque diz aquilo que outros nem se atrevem a pensar. Porque tem coragem. Porque é o líder do seu exército e relaciona-se com os jogadores de uma forma familiar. Os jogadores abraçam Mourinho como se ele fosse outro jogador. Basta recordar o emocionado abraço que teve com Materazzi depois de os dois terem ganho a Champions no Inter. Deve ser o único treinador que consegue ter essa proximidade com os seus jogadores. Mas nada disto teria o mesmo impacto se ele não vencesse, se ele não fosse capaz de se reinventar a cada novo desafio. Os títulos são o primeiro ingrediente para o tornar especial. O resto da receita vem do seu feitio, da sua postura, da sua forma de trabalho. Sem isso, provavelmente, não conseguiria vencer. Para Mourinho, o futebol não se limita aos treinos e aos jogos. É também esse lado da imagem. O contacto com os jornalistas. Entende totalmente o fenómeno atual do futebol, muito ligado à comunicação, e domina todas as partes do jogo. As do jogo jogado e as do jogo falado. 
 
Defina Mourinho numa palavra (sem ser Especial). 
 
Vencedor.
 
Já teve alguma reação de Mourinho ou alguém próximo dele?
 
Ainda não. 
 
Na pesquisa e nas pessoas que ouviu, qual a história mais surpreendente?
 
Na pesquisa encontrei várias histórias que reforçam esse carácter rockstar e anti-herói de Mourinho. Não há uma história. São muitas. É um estilo, um modo de vida. Mourinho transcendeu-se como simples homem. Criou uma ideia. Um conceito à sua volta. E, como dizia V, o protagonista de V for Vendetta, as ideias são à prova de bala. Por isso, é tão difícil vencê-lo e deitá-lo abaixo. Muitos já tentaram, especialmente na sua passagem pelo Real Madrid, as não conseguiram.  
 
Depois de escrever o livro, ficou a amar ou a odiar Mourinho?
 
Quando decidi escrever já admirava Mourinho e essa admiração permanece intacta. É como diz o famoso treinador italiano Arrigo Sacchi: «Mourinho é uma personalidade única. Nunca é banal e está sempre bem informado. É um fenómeno a estudar. É um exemplar único. Não existem cópias.»
 
Já escreveu biografias de outras figuras do desporto, como Fernando Mendes e Paulo Futre. Qual das figuras é mais fascinante?
 
Cada um à sua maneira, têm todos lados interessantes. 
 
Por que é que as pessoas devem ler o seu livro?
 
Já se escreveram centenas de livros sobre Mourinho. Biografias da parte do Porto, do Chelsea, do Inter, do Real Madrid ou tudo junto, análises de sucesso e da sua forma de liderança, etc. Eu sabia isso e não queria fazer mais do mesmo. Este é o primeiro livro que retrata Mourinho como uma figura ímpar no futebol, uma rockstar do desporto-rei, um anti-herói genuíno num desporto cheio de falsos heróis. Há sempre uma relação muito presente e forte com a música o cinema e a literatura. É uma análise que ainda não tinha sido realizada. Este livro é único e muito diferente de todos os outros que já escreveram sobre ele. E sei do que falo porque os li quase todos. 

Texto: Humberto Simões; Fotos: DR 

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