A rapidez e a agressividade com que alguns sectores da sociedade reagiram aos seus comentários deixaram-na magoada. Tanto que só agora voltou aos ecrãs, na SIC Mulher, e reage publicamente a esse assunto. Mas garante: “Não cometi nenhum crime.”
VIP – Como está a relação dos portugueses com a leitura e com os livros?
Margarida Rebelo Pinto – Para muitos portugueses é difícil comprar livros. Quando estão a contar os cêntimos para pagar as contas, as rendas, as escolas dos filhos, os extras que surgem na vida, é natural que os livros fiquem para segundo plano. No entanto, o trabalho feito pelos escritores portugueses nos últimos 15 anos conquistou um território que não se vai perder. Os portugueses gostam cada vez mais de ler e têm mostrado muita estima pelos seus autores, no geral.
Consegue explicar a razão do seu sucesso enquanto escritora?
Eu falo da vida como ela é… O Sei Lá ultrapassou todas as minhas expectativas: vendeu mais de 200 mil exemplares; o Não Há Coincidências, mais 200 mil. Foi uma onda de que eu não estava à espera e que fui acompanhando, porque nunca mais parei de escrever. Na altura não havia Facebook, mas era abordada na rua pelas pessoas que liam os meus livros e que me falavam deles de uma forma muito calorosa. Há um processo fundamental, que eu não fabriquei, que é uma identificação fortíssima com as leitoras e também com alguns leitores. Há essa identificação, se calhar porque venho da publicidade e dos média e, por isso, a minha forma de comunicar é direta e concisa. Depois, porque falo daquilo que é o mais importante na vida das pessoas: a gestão dos afetos e do património afetivo. Mal- aventurados aqueles que põem isso de parte, pensando que não é importante.
Esta é a primeira entrevista depois das suas afirmações polémicas sobre as greves e o País em geral, no programa Bom Dia Portugal. Consegue entender as reações violentas ao que disse na altura?
Consigo perceber que, por ter usado algumas expressões infelizes – como, por exemplo, “repulsa”, que, ainda por cima, não faz parte do meu vocabulário –, terei magoado as pessoas. O que não consigo perceber é a onda de violência e de bullying virtual que as minhas declarações geraram! Eu disse que era contra aquele tipo de manifestações dentro da Assembleia da República, nunca disse que era contra as manifestações, que é um direito que está consagrado na Constituição da República Portuguesa. Depois, disse que as pessoas deviam pagar taxas moderadoras e não me expliquei bem: o que queria dizer era que as pessoas que podem pagar taxas moderadoras devem pagá-las, para aqueles que, de facto, não podem – os pensionistas, reformados, pessoas que vivem em dificuldades extremas –, possam usufruir delas. O meu discurso foi espontâneo e fui convidada a usar do meu direito de liberdade de expressão num espaço de comentário. As pessoas podem concordar ou não, mas há uma diferença entre isso e irem para a Internet insultar-me, escrever ofensas sexuais explícitas…
Este é um fenómeno recente que surgiu com as redes sociais e que não dá tempo, sequer, para se reagir…
Na altura, não reagi porque seria mal-entendida. As pessoas começaram a reagir a partir de um vídeo cortado, editado, onde aquilo que eu dizia já tinha sido manipulado e, por sua vez, tinha informação por cima, a induzir as pessoas ao ódio. Eu sou profundamente grata ao meu país, sempre quis ser escritora, viver da escrita, sempre quis que o meu filho nascesse num regime democrático, com liberdade de expressão, onde pudesse escolher a profissão que vai querer ter e isso vai acontecer. Fui um alvo que tentaram abater. Porquê? Porque usei da liberdade de expressão? Senti-me ameaçada, assustada, vi o meu filho e as pessoas mais próximas de mim em stress profundo por aquilo que se estava a passar comigo. Criou- se uma onda de ódio momentâneo…
Em relação ao Bruno Nogueira, acha que a reação dele foi adequada ou desproporcionada?
Não tenho palavras para descrever o que o Bruno fez…
Na altura, como reagiu o seu filho?
Sentei- me com ele na sala, com toda a calma que podia, e expliquei-lhe o que estava a acontecer. Curiosamente, o meu filho, que apesar de ter apenas 18 anos, é muito maduro, disse: “Ó mãe, isto é um caso tipo Isabel Jonet.” E perguntou se eu ia reagir, ao que respondi: “Não. Enquanto as águas estiverem agitadas, não vou reagir, porque só se vê o fundo quando as águas estão paradas.” Não quis gastar o meu tempo a identificar quem estava contra mim ou a meu favor. Nestes momentos é que vemos quem é que são os amigos, e a vida continua. Não é nenhum caso de vida ou de morte, não cometi nenhum crime, não quis magoar nem insultar ninguém…
O que acha da situação atual do País, da crise que teima em não nos largar…
Sinto muito desânimo, muita tristeza, conheço muitas pessoas que tinham situações estáveis e que as perderam, que ficaram sem emprego, tiveram de emigrar, perderam as casas… custa- me muito ver pessoas com mais de 50 anos em situações precárias. Continuo a dizer ao meu filho que Portugal é um país com grande potencial e que vivemos num paraíso à beira- mar plantado, mas nunca vi as pessoas tão tristes como agora.
Lançou recentemente o seu 19.º livro, Há Sempre a Primeira Vez. Qual tem sido a reação das pessoas a este romance?
Este livro reúne uma série de textos que são reflexões, histórias e algumas confissões sobre a temática amorosa. Nos últimos 15 anos, depois de um casamento que não correu bem e de alguma solidão, fui mudando a minha visão do amor. Essa visão foi-se tornando mais prática, mais terra-a-terra… O amor não existe, existem provas de amor. Sempre fui muito sonhadora, muito imaginativa, efabulatória, como são todos os escritores, e as experiências de vida que tive ensinaram-me a ter uma visão do amor mais séria, do amor construído. E é sobre esta visão mais amadurecida do amor que é este livro. As reações que tenho tido são muito positivas, porque as pessoas, mais uma vez, identificam-se ou encontram pistas para algumas das questões que as preocupam ou conseguem entender alguns traumas recônditos que tenham no seu subconsciente para lidar com a temática amorosa. Porque não amamos como queremos, mas sim como podemos. Tem a ver com a nossa educação, com os exemplos de amor ou de conjugalidade que vivemos e o que presenciámos ou não, com situações de abandono e de negligência. Oitenta por cento do meu otimismo e da minha boa disposição vem de uma fortíssima estrutura familiar.
Passou pelo Independente, pelo Se7e, pela Olá, Máxima, Marie Claire… Que análise faz do mercado editorial da altura e do atual?
Era outro mundo. O mercado das publicações, dos média, sofreu uma involução. Apanhei o Independente no início, ele foi um jornal importantíssimo, que mudou a forma de comunicar em Portugal. E quando às vezes encontro antigos colegas de redação desse tempo, digo-lhes que tenho tantas saudades do burburinho da redação, mas eles afiançam que agora é completamente diferente, porque começaram a levantar-se outros valores que se impuseram no mercado e começaram a aparecer os grandes grupos, a maximização dos recursos nas redações… Mudou tudo, dizem-me que não tem nada a ver com o que era há uns anos. Mas foram bons tempos. Neste momento, as pessoas querem é outras coisas, já estão habituadas ao fast food na informação. As publicações têm cada vez menos espaço, menos interesse em fazer jornalismo de investigação, porque estão cada vez mais subjugados aos grupos económicos a que pertencem e não sei até que ponto é que os leitores não estão de acordo com esse tipo de informação, porque também já estão habituados a ter informação em fast food. Eu acho que vivemos uma fase de fast food em muita coisa e, mais uma vez, a literatura tem aqui um papel fundamental, porque agarra as pessoas. Os livros ficam, as pessoas podem sublinhá-los, podem lê-los inúmeras vezes, partilhá-los… por isso é que eu acho que os livros nunca vão morrer, as pessoas vão sempre precisar deles. Um livro é uma grande companhia, tive ao longo da minha vida contactos incríveis com as pessoas, até via Facebook, que conversam imenso comigo. Um escritor, quando está a escrever, está a escrever para ele próprio, ou sobre ele próprio, porque os escritores são todos um bocado stripteasers da alma. Mas é um privilégio conseguir chegar às pessoas e conseguir que as outras pessoas também sintam e pensem aquilo que sentimos e pensamos. E isso é uma forma de lhes fazer companhia.
Sei que tem uma relação neste momento, que o seu coração está ocupado pelo Afonso Vilela…
Não falar da minha vida privada é um direito que me assiste e um dever para com aqueles que amo, portanto… não falo sobre isso!
Texto: Luís Peniche; Fotos: Bruno Peres e Liliana Silva; Produção: Manuel Medeiro; Maquilhagem e cabelos: Vanda Pimentel com produtos Maybelline e L’Oréal Prefessionnel
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