Numa altura em que celebram 15 anos de música, Nélson e Sérgio Rosado revisitam a carreira numa conversa com a VIP. Humildes e “sem papas na língua”, os Anjos falam sobre aquilo que está mal na música portuguesa, na mentalidade de alguns artistas e no que desejam para o futuro. E ainda da forma como gerem a vida pessoal, de modo a que Andreia, mulher de Sérgio, Ian e Iara, os filhos do casal, e Sílvia, Kelly e Kevin, mulher e filhos de Nélson, não sejam prejudicados.
VIP – Estão a celebrar 15 anos de carreira. Imaginavam chegar aqui?
Nélson Rosado – Sonhávamos chegar aqui. Sabíamos que, independentemente de haver sucesso ou não, estaríamos mais 15 anos na música. Mas sonhávamos com uma carreira destas. Tem sido aquilo que nós idealizámos e não mudávamos nada. Existiram coisas menos positivas, mas fizeram parte do nosso crescimento.
Ficou algum passo por dar?
Sérgio Rosado – Apostar no Brasil. Era uma opção que tínhamos de tomar. Se tivéssemos tomado a decisão de apostar no Brasil, muita coisa teria ficado para trás em Portugal e, se calhar, não estávamos assim. Acredito que o nosso destino está traçado com uma linha firme e não há volta a dar. Assumimos que temos um percurso feliz, a nível profissional, pessoal e familiar.
Portugal é pequeno demais para artistas com uma carreira?
NR – Portugal é, realmente, um país pequeno, mas suficiente para aqueles que têm a sorte de agarrar num público e de o trabalhar e viverem da música. Não dá para todos. É uma realidade. Nos anos 90, quando surgimos, e se verificou um grande boom da música nacional, falava-se das bandas cometa que apareciam e desapareciam. Gostava de ver esses pseudointelectuais críticos de música a falar das que aparecem agora. É ainda mais rápido o aparecimento, o estouro mediático e o desaparecimento.
Como é o caso de bandas ligadas à televisão.
SR – Adoro o meu país, os nossos costumes e as nossas pessoas, mas, se calhar, sentimos que é pequeno para nós. Temos muito a aprender com as coisas boas dos outros países e não apenas com as más. Ainda existe o preconceito de unir áreas diferentes em prol de um bem comum. Esta mentalidade tem de mudar. E, ao pensar nisso, pensamos que se tivéssemos nascido noutro país poderíamos ter sido mais ambiciosos. O que não quer dizer que não o tenhamos sido, pois, se assim não fosse não estaríamos aqui.
Os portugueses continuam a não defender o que é seu?
NR – É a única coisa onde acho que piorámos, ao longo destes 15 anos. Brincaram com os artistas portugueses. É um facto que a quota de música portuguesa cresceu, mas à custa de projetos de pessoas que não levam a música de forma profissional. É um part time. Até pode passar na rádio, mas não tem sequência ao vivo. Além disso, os artistas que as rádios já passavam, passaram a tocar 20 vezes, em vez de dez. Ouve-se mais música, mas dos mesmos artistas. O preconceito está patente. É o fulano que não se mistura com beltrano e andamos nisto. Ainda não chegou a altura de fazer um disco com amigos, mas acho que será muito complicado. Antevejo dificuldades. Não se admirem que isso nunca aconteça.
Estamos a falar de guerras de editoras ou de mentalidades dos artistas?
NR – Acima de tudo, mentalidade. A minha música é melhor do que a tua…
SR – Alguns dizem que não tem nada a ver e que não faz sentido existir uma mistura. Acho que os duetos e as parcerias só fazem sentido quando se misturam coisas diferentes. A magia da música é essa. Se é tudo igual, não faz sentido.
NR – Por exemplo, basta comparar o Rock in Rio de Lisboa com o de Madrid. Por cada banda internacional que atuou em Madrid, tinham de colocar um determinado número de bandas espanholas a atuar no palco principal. Não é chutarem-nos para os palcos sunset e dos duetos e apenas uma elite é que atua no palco principal. Isso é algo que me deixa triste.
Mas já foram convidados para atuar…
NR – Sou sincero. Trata-se do melhor festival de música que acontece em Portugal. Pela localização, público, cartaz e produção. É o mais generalista. Já fomos convidados quando fizemos dez anos de carreira. Não se concretizou. Temos pena por não ter acontecido, mas a vida é longa. O festival está para durar e só espero que não nos levem lá quando já formos velhinhos, porque gostava de curtir aquilo com muita energia.
Fazem falta mais artistas que pensem da mesma forma que vocês?
NR – Somos músicos que vemos a música como um mundo redondo para todos. Não o fatiamos. Não temos capas vestidas. Não temos capas para este e para aquele. Somos nós próprios. Quem nos conhece, sabe que somos assim. E gostava que existisse mais este espírito em Portugal. Faz muita falta. Dia 5 de outubro dão um concerto especial no Campo Pequeno.
Que memórias guardam dos tempos do primeiro concerto?
SR – O nervosismo era grande. Recordo-me de cantar ao vivo no lançamento do primeiro álbum. Foi a loucura. Uma das coisas que nos mantém vivos é esta ansiedade de subir para o palco. E mantemos isso dos primeiros tempos. A motivação e energia não mudaram. Há quem diga que já fizemos tudo, mas há muitas coisas para fazer.
O que se pode esperar deste concerto?
NR – É um concerto especial. De carreira. Só vai acontecer este. Quem nos acompanha pode matar saudades. Quem nunca nos viu, venha descobrir porque andamos aqui há 15 anos. Podem esperar da nossa parte total entrega e uma produção à altura do evento. Vai existir ainda uma surpresa com uma música editada no penúltimo disco. Ninguém vai estar à espera de um som daqueles. Nessa música, teremos um convidado em palco. É o dia de retribuir aquilo que nos têm dado ao longo destes anos.
Sentem pressão para que seja o melhor concerto de sempre?
NR – Este é o concerto! SR – É o concerto dos 15 anos. Queremos dar tudo em palco. Já não fazemos um grande espetáculo em Lisboa há muitos anos e sabemos que o público está ávido de nos ver. Queremos que seja uma noite especial.
Pensam que podem ser a banda sonora de uma história de amor? Ou da conceção de uma criança…
NR – Fazem-nos chegar essas mensagens (risos). Este ano, em Setúbal, houve um pedido de casamento em cima do palco.
E pedem-vos para atuar em casamentos?
NR – Claro. Recebemos muitos pedidos. O que fazemos, quando conseguimos, é enviar uma mensagem por vídeo, que passa nos casamentos.
SR – É a magia da música. É extraordinário. Tiveram um impacto forte na televisão com a banda sonora de Vingança.
Gostavam de voltar a fazer algo do género?
SR – Fomos pioneiros, nesse sentido. E resultou. As músicas eram boas, a novela fantástica e tinha um grande elenco. Estavam lá todos os ingredientes para ser um sucesso.
NR – Estamos disponíveis e era bom voltar a viver a experiência de pegar numa banda sonora e dar algum tempero. Mas teria de ser algo ao nível do que fizemos.
Chegaram a pensar desistir do que fazem?
SR – Nunca. Como costumo dizer, aquilo que não nos mata torna-nos mais fortes. E os momentos menos bons dão-nos força. De resto, é como os casais. Mal do casal que nunca discutiu.
NR – Mas nada que colocasse o projeto em causa. Nem entre nós nem com outras pessoas
. Imaginam-se com carreiras distintas?
SR – Isto é quase como uma religião (risos). A marca Anjos tem muita força e tem uma história muito forte. Se, daqui a uns anos, fizermos uma coisa pontual, isso não significará o final dos Anjos.
NR – É um projeto que nos deu muito trabalho e não vamos abdicar dos Anjos por nada deste mundo. Ainda há muito para fazer. Para o ano, haverá um álbum de originais e muito mais.
O mais complicado da carreira é gerir o lado familiar?
SR – Já nos conheceram assim e entraram nas nossas vidas com a carreira em alta. A família tem visto crescer a nossa carreira e as nossas mulheres sentem o projeto como sendo delas. Vibram muito. Estamos contentes porque fazemos aquilo de que gostamos e elas ficam contentes por nós.
NR – Elas já sabiam como ia ser. Isso fica patente na forma saudável como estão nas nossas vidas. Não existe nada a apontar a ninguém. A instabilidade de horários ajuda a apimentar a relação porque não existem rotinas.
Os vossos filhos mais velhos têm a noção de que os pais são artistas?
SR – Quando eles nasceram, os pais já tinham esta vida. Vejo que o Ian, que tem agora dez anos, sente orgulho porque o pai é conhecido pela música. Isso é interessante e saudável
. Imaginam o dia em que os vossos filhos sobem ao palco para cantar com vocês?
NR – Se for algo natural, não tenho qualquer problema. Se for algo forçado, acho ridículo. Tanto o Ian como a Kelly andam na nossa academia de música, mas andam lá porque está cientificamente provado que faz bem às crianças. No meu caso, gostava que os meus filhos seguissem outro rumo que não a música. Eles vão fazer o que quiserem, mas defendo que o filho não tem de ser aquilo que o pai é. Deverá ser melhor do que o pai numa área qualquer. Senão, isto parece um negócio. Peço desculpa a quem o faz, mas não concordo.
SR – Vamos fazer aquilo que os nossos pais nos fizeram. Ou seja, não os vamos obrigar a nada.
Conseguem perspetivar os próximos 15 anos de carreira?
SR – Temos objetivos a médio prazo, que queremos cumprir. Nos próximos 15 anos pretendemos manter a mesma filosofia. NR – Não vale a pena pensar a mais de um ano de distância. Até porque o mercado mudou…
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