David Fonseca
“Seria uma seca ter novamente 20 anos”

Famosos

A caminho dos 40 anos e com dez de carreira, orgulha-se do percurso musical que construiu

Sex, 15/03/2013 - 0:00

David Fonseca é um dos músicos portugueses mais brilhantes da atualidade. Num misto de loucura e paixão pelo que faz, o artista lançou dois álbuns este ano e, horas antes de subir ao Coliseu dos Recreios, falou com a VIP sobre a carreira, vida e ainda sobre os dois filhos.

VIP – Dois álbuns num ano é loucura, paixão pelo que se faz ou um misto de ambos?
David Fonseca – É um misto claramente. Mas é um facto que é loucura. Não quis fazer dois discos porque a ideia era fazer uma história que durasse um ano e isso seria traduzido num disco. Comecei no primeiro dia da primavera e quando cheguei ao primeiro dia do outono já tinha feito um disco. Acabei por continuar e fiz dois. Foi uma tarefa dura porque fazer um disco como um diário é muito difícil. Retira-te muito da vida real.

Prefere concertos em salas pequenas. É um sinal de respeito por quem gosta do seu trabalho?
Nunca vi a música como um sucesso em escala. Isso faz-me confusão. Além disso, seria estranho que só conseguisse tocar em salas de grande escala. Tenho uma grande paixão por salas pequenas. Porque vejo todas as pessoas e porque o espetáculo é diferente. Preocupa-me fazer bons espetáculos.

O primeiro álbum foi escrito em digressão. O segundo em casa. Aquilo que escreve e canta é um espelho do que é?
Sim, mas não é literal. Tudo aquilo que escrevo tem a ver aquilo que sou, vivo e vejo. Não é inventado. Não consigo escrever assim, o que seria mais fácil. Os meus discos são todos autobiográficos, mas não de uma forma literal. Não digo o que comi ou com quem falo (risos). Está ligado a uma espécie de eu interior que não é fácil de ver no dia-a-dia.

Fez o segundo a promover o primeiro. Qual o truque para uma conjugação perfeita?
Não há truque. Foi horrível (risos). Foi um equilíbrio difícil. Tive um ano infernal, mas acabou por resultar.

O mais complicado é conjugar tudo isso com a vida familiar?
A minha profissão é muito liberal e trabalho muito em casa. Acho que passo mais tempo com a minha família do que a maior parte das pessoas. A ideia de que os músicos estão sempre longe de tudo e todos é um mito muito estranho. Acho que não é bem assim porque passam mais tempo com as pessoas.

Como é que os seus filhos lidam com a voz que ouvem na rádio?
Acho que sou sempre o pai deles, mesmo quando estou a cantar na rádio ou na televisão. Eles não vêm um artista. Vêm sempre o pai. Sabem o que faço e gostam da ideia. Mas nem sequer compreendem muito bem que a minha profissão seja diferente da dos outros pais. E no fundo é mesmo assim (risos).

Nota-se o seu lado pai na vertente artística?
Não se nota porque as minhas canções não são sobre isso. Como pessoa sou diferente porque as prioridades mudam. Quando não se tem mais ninguém no mundo pensamos de forma diferente.

Teria mais sucesso se fosse norte-americano por exemplo?
Não sei. Essa afirmação é recorrente, mas não é necessariamente assim. Já estive no estrangeiro e lá percebe-se o quão grande é o universo musical americano. Quando ia a um festival no Texas conhecia músicos com muito talento de quem nunca se ouviu falar. Nessa altura penso que tiveram azar em nascer num país grande. E é preciso sorte. E tive essa sorte em Portugal.

Com esta conjuntura, vê-se como um vendedor de sonhos com aquilo que as suas músicas podem provocar nas pessoas?
Acho que a música tem essa função. Não quero iludir ninguém, mas o que interessa é que as pessoas se centrem mais na parte emocional.

O que ainda lhe falta alcançar?
Acho que falta sempre quase tudo. Acho que esse é o segredo. Quando acabo um disco dou por mim a dizer que sei o que quero fazer no próximo. Isso é essencial numa área criativa. O sucesso permite-me ter esta profissão, mas não pode ser aquilo que persigo.

Daqui a algumas horas sobe ao palco do Coliseu dos Recreios. Ainda fica nervoso?
Só mesmo um bocadinho (risos).

Alguma vez pensou desistir?
Muitas vezes, especialmente no início. Não queria ser músico, queria ser fotógrafo. A ideia de me tornar músico profissional era algo ilógico. Fiz o CD dos Silence4 e pensei que seria o único (risos). Mas não era por não gostar disto, mas porque gostava de outras coisas.

Este ano faz 40 anos. Tem medo do avançar da idade?
Não (risos). Não sinto nada disso. Acho que o meu corpo é mais jovem do que eu. Acho que as pessoas têm uma doença da juventude, mas isso diz-me muito pouco. Eu não vivo essa ideia. Gosto da idade que tenho e sempre fui assim. Acho que seria uma seca ter 20 anos novamente (risos).

Já está a pensar noutro disco?
Estou a evitar pensar nisso (risos). Vou tendo ideias e vou fazer a tournée. Vamos tocar muito este ano.

Texto: Bruno Seruca; Fotos: Filipe Brito e D.R.

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