Entrevistar Luís Jardim na esplanada de um café da capital revelou-se uma tarefa difícil. Entre perguntas e respostas, o músico foi muitas vezes alvo de abordagens de quem passava e o reconhecia. Simpático e acessível, respondeu a todas. “As pessoas conhecem-me e estão interessadas no que faço. Se calhar isso tem mais sabor do que ganhar muito dinheiro. Ser apreciado dá um sabor muito especial. Adoro!” Na companhia da mulher, Teresa Silveira, contou que finalmente encontrou alguém para “assentar” e revelou o desejo de acabar os seus dias em Santa Mónica ou Malibu, nos Estados Unidos.
VIP – Saiu da Madeira com 16 anos. A ilha era demasiado pequena para os seus sonhos?
Luís Jardim – Comecei muito cedo. Formei a minha primeira banda com dez anos. O meu pai faleceu quando eu tinha nove. Era médico, mas foi um dos fundadores da Tuna Académica de Coimbra e deixou-me seis guitarras. Nunca tinha ligado à música. A minha mãe tentou tudo, aulas de piano, de canto, tudo, e eu não ligava nenhuma. Quando o meu pai faleceu deram-me uma guitarra e a minha mãe prometeu que se aprendesse a tocar o tema Voo do Moscardo me comprava uma guitarra elétrica. Numa semana aprendi!
Sem aulas?
Sim, sozinho. Depois comecei a perceber que gostava e fui aprender.
Que sons influenciaram um miúdo de dez anos para criar uma banda?
Na onda do Elvis Presley, rock’n’roll, estamos a falar de 1959… Depois apareceram os Beatles e aí passou a ser entre o rock do Elvis e o pop dos Beatles.
Aos 16 foi para Londres…
Sim, consegui convencer o meu avô que queria ir para estudar Direito para gerir as coisas da família. Fui, mas comecei a faltar às aulas, ficava a tocar nas ruas ou nos cafés até de madrugada e quando voltei a casa confessei. O meu avô disse-me que se era música o que eu queria, ia fazê-lo como deve de ser. Mas quando fui para Londres claro que já ia com o sentido na música.
O seu avô foi a figura masculina no seu crescimento…
Sim, mas o meu avô era um homem de negócios e não tinha muito tempo para me aturar.
E a sua mãe?
Conseguiu ser pai e mãe de uma forma muito eficaz. Foi, sem dúvida, a pessoa mais importante da minha vida. Foi ela quem me deu oportunidade, convenceu os meus avós, ajudou-me quando estava em Inglaterra, era uma pessoa excecional [morreu há dois anos]! Foi verdadeiramente a minha mão.
Nasceu numa família abastada. Como foi a sua infância na Madeira?
Graças a Deus, tive sorte de nascer no chamado berço de ouro. Mas mesmo tirando isso, a vida social da Madeira é muito engraçada porque nos conhecíamos todos. Nunca se está sozinho, mesmo agora. Quando eu e a Teresa [Silveira, a mulher] vamos à Madeira nunca combinamos nada com ninguém, porque não é preciso. Portanto, crescer na Madeira é uma sonho. Tive uma juventude que nunca mais vou esquecer.
E depois vai para Inglaterra completamente sozinho. Como se adaptou?
Com a música! Falava bem inglês, mas não suficientemente bem, então decidi – e antes de iniciar o tal curso de Direito que cheguei a frequentar, mas não terminei – fazer dois exames que existem em Inglaterra muito importantes, o Lower Cambridge e o Proficiency Diploma. Quando cheguei ao colégio de línguas tinha 90 colegas portugueses e desses só fiquei eu. Dois anos depois “meteram todos o rabo entre as pernas” e voltaram para Portugal com saudades da mamã, da titi…
Mas de certeza que o Luís também tinha essas saudades.
Claro, mas eu tinha uma coisa que eles não tinham, a música! À noite ia para a rua com a minha guitarra, a namorada a receber as moedas, ia aos cafés, aos bares perguntar se podia tocar. Chorei muitas vezes, claro. Lembro-me de estar em casa naqueles dias importantes e pensava se ia conseguir aguentar. Mas depois comecei a trabalhar com músicos e criei um ciclo de amigos. É uma vida diferente e temos de nos desenrascar. Mas é uma vida solitária.
Como é que passou dos bares para as bandas? Trabalhou com muitas ao longo do seu percurso.
Nesta profissão é muito bom ter algum talento, não é?! Zero não funciona. Com o talento vem a segurança, mas também é preciso sorte. Eu tive. Estava a tocar num bar de jazz, chamado The Kessington, e um dia entrou uma pessoa que me diz: “No dia ‘x’ os Rolling Stones vão fazer um concerto no High Park, 250 mil pessoas e precisam de um percussionista.” Mas queriam um preto. Então fui com a condição de pintar a cara de preto. Portanto, toquei preto, com uma cabeleira afro e uns óculos Ray-Ban verdes. No dia seguinte tive não sei quantos telefonemas de pessoas que queriam trabalhar comigo. Abriu-se a porta. Não acontece a toda a gente. Podia ter estado a tocar no bar mais umas dez noites e não ter tido sorte.
Mas também podia ter tido essa sorte e não ter agradado…
Sim, mas sabe, eu era muito confiante! Ainda sou um bocado atrevido e confiante. Não é uma questão de ego, mas sei aquilo que sou, aquilo que valho e sou muito bom no que faço. Essa convicção impressionava. Por isso, nunca fui rejeitado por ninguém com quem trabalhei, voltaram sempre a chamar-me. Em 1969 formei a minha banda, os Rouge, em 71 lancei um disco. O primeiro álbum vendeu 4,7 milhões. Estivemos juntos três ou quatro anos. Depois dos Stones toda a gente me chamava para trabalhar. Quando a banda acabou fui chamado pelo Tom Jones para tocar com os The Squires. Consegui entrar sempre por cima, pensar sempre grande! Eu queria ter sucesso, dizer “vim e fiz”, mas também muito pela minha mãe, porque ela delirava.
Era uma mulher à frente no seu tempo?
Super! A minha mãe levou-me ao Woodstock! Ela disse-me: “Faz a tua mala que eu vou passar por Londres.” Metemo-nos no avião e levou-me para os Estados Unidos. Foi espetacular.
O seu perfeccionismo é conhecido. Herdou-o de quem?
Dos meus pais. Mas também é uma questão de profissionalismo. Se vamos fazer um trabalho, temos de o fazer bem feito.
Calculo que tenha ganho muito dinheiro nessa altura.
Como escolhi a precursão, numa sessão tocava quatro instrumentos, logo recebia quatro vezes mais do que um baixista, por exemplo. Por isso, concentrei-me nisso porque era o que pagava mais. Isto é a pura verdade! Não era o que gostava mais, gostava de baixo e bateria, mas aquele valia a pena. Fazia o meu próprio preço para um dia inteiro de trabalho. Fui um bocado mercenário.
Usava esse dinheiro para se sustentar?
Tive filhos muito novo. A minha filha Gabriela nasceu quando eu tinha 21 anos. Sempre tive família. Mas durante os anos dos Rouge fiz muito dinheiro. Ainda hoje de manhã apareceram oito mil euros na conta de royalties antigos dessa altura. Era tudo para a minha família viver bem, bons colégios, casas boas. O dinheiro fez-se para se gastar, não vou para a cova com dinheiro. Desde que se tenha um bocado de juízo.
Depois foi para os Estados Unidos?
Sim, no final de 1974 fui fazer um curso de três anos na Faculdade Berklee. Os Estados Unidos é tudo mais complicado. Há muitos músicos, muita gente. É um mundo cheio de talento, com muitas influências, grandes músicos, grandes técnicos. O músico americano tem mais técnica porque estuda mais, mas o inglês é mais criativo. Gosto muito da América. Por mim vivia lá. Trabalho muito lá, não numa base permanente, mas acho que vamos acabar a viver em Los Angeles.
Quando decidiu voltar permanentemente para Portugal?
Assim nunca voltei. Estou cá regularmente porque conheci a Teresa. Se não a tivesse conhecido, de certeza que não morava cá, embora adore Lisboa. Sou madeirense, mas gosto muito mais de Lisboa. É a minha segunda cidade, a primeira é Londres. Vim cá porque fui chamado para produzir o Rui Veloso, em 1988. Depois conheci o João Pedro Pais, a Adelaide Ferreira… Andava entre cá e lá e acabei por ser convidado para os Ídolos. A televisão foi uma alternativa gira, porque estava sempre metido em estúdio ou a fazer grandes tournées.
Como é que conheceu a Teresa?
Na festa de aniversário da irmã dela. Ficámos amigos e depois começámos a namorar. Depois dos 50 anos encontrei finalmente alguém para assentar.
Os músicos têm fama de sedutores…
Sim, mas quando era muito novo. Mulheres e bebida…
Sex, drugs and rock ‘n roll…
Sim, tirando a parte das drogas. Por acaso nunca fui de drogas. Mas já fui casado várias vezes e falhei em todas (risos). Mas desta vez parece que acertei. Estamos juntos há oito anos.
Quando foi júri do Ídolos não era muito bem visto pelo público português.
Cheguei a ser posto fora de um café, uma vez no Galeto estavam cinco tipos à minha espera. Tivemos de chamar a polícia para me tirarem do restaurante. Houve ainda uma senhora que foi armada para um dos programas para me dar um tiro… tive cenas perigosas. Mas não disse nada que não dissesse aos meus quatro filhos e às minhas duas enteadas se fosse o caso: “Não cantas, escolhe outra profissão.”
Mas alguma está no meio?
Todas elas são talentosas. A Stefania é atriz, a Mariana e a Rebeca são boas cantoras e a Natacha estuda cinema. Mas também não lhes aconselho a arte em Portugal, em Inglaterra sim. Cá é complicado, por isso nem quero, nem espero que vão pela música.
Com A Tua Cara Não Me É Estranha fez as pazes com o público português.
No segundo Ídolos já me entendiam melhor e comecei a ter muitos fã. Tenho imensos. Vêm ter comigo e dizem-me: “Assim é que é, não está com meias-palavras.” Passa–se o mesmo com o meu primo, o Alberto João. Toda a gente o critica, mas toda a gente gosta dele, porque não tem “papas na língua”.
Tem uma relação próxima?
Sim, somos primos direitos. Os nossos pais eram irmãos. Às vezes zango-me um bocado porque as pessoas só conhecem o homem da televisão.
E a sua relação com o Manuel Moura dos Santos?
Tivemos um desacordo, fui exagerado. Trabalhei com ele porque era agente do Rui Veloso, era um bom profissional, tratou-me sempre muito bem. No Ídolos tivemos alguns desacordos, uma pequena discussão por causa de uma assunto familiar que foi projetado naquela altura, mas se ele estivesse aqui sentado estava à conversa com ele. O problema é que se falou e continua a falar muito nisso. As revistas não deixam esquecer.
O que é que ouve de música?
Sabe que eu sou um gajo complicado (risos). Como trabalho com música, acabo por só ouvi-la como lazer no carro da Teresa. Nem no meu ouço. Não sou de ir para casa e pôr música, prefiro ver um filme.
Entretanto, tem um projeto para uma escola de música.
Sim, já tem quatro anos. Mas não do género que existe. A ideia é uma escola onde se entra e se dança, canta, toca, faz-se tudo, tipo série Fame. Sai-se com uma bagagem completamente diferente… [Teresa interrompe para dar a notícia de que Isaltino Morais pode ser preso]. O Isaltino é meu sócio (risos). Vivemos naquela zona e tivemos uma conversa e entrámos juntos no projeto. Já tenho o prédio fantástico, mas estamos a reparar algumas coisas. Está a planta aprovada e dois anos depois íamos arrancar finalmente com o projeto… veio a crise, a Troika.
Mas não é para desistir?
Não! Até estamos a pensar fazer agora uns cursos de verão, porque metade do prédio já dá para trabalhar. Fazer uma espécie de teste, arranjamos um tema e fazemos uma peça que implique cantar, dançar e representar.
Já viajou muito. Onde se vê a viver daqui a uns anos?
Gostaria de “parquear” em Santa Mónica ou Malibu, são duas zonas que gosto muito. Agora tenho de convencer a Teresa. Mas vou morrer a trabalhar. Gostava de ter uma casa em Portugal, uma em Los Angeles e outra em Londres.
Na Madeira?
Tirando o social, os amigos, é muito complicado viver “num sítio três por três”. Faz–me confusão estar ali “preso”. Se o tempo está mau, o avião já não levanta, já não posso sair de lá. Em Lisboa apanho o comboio e vou para outro lado qualquer.
Texto: Carla Simone Costa; Fotos: Paulo Lopes; Produção: Manuela Costa; Maquilhagem e cabelos: Vanda Pimentel com produtos Maybeline e L’Oréal Professionnel;
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