Aos 44 anos, e recentemente separada do editor de imagem André Marques, com quem esteve casadadurante cerca de dois anos, Clara de Sousa conversou com a VIP sobre o seu primeiro livro, A Minha Cozinha. Numa entrevista em que se recusa a falar sobre relacionamentos, a jornalista opta por não alongar-se sobre a sua felicidade pessoal, principalmente nesse campo, já que acredita que, como diz: “Não nos podemos focar apenas numa noção de felicidade porque se torna demasiado redutor.” A pivô da SIC prefere antes abrir o coração sobre o que considera ser realmente mais importante na vida: os afetos. Porque são esses os “ingredientes” mais evidentes neste seu mais recente projeto, que nasce também como uma homenagem à mãe, que morreu há 11 anos.
VIP – Cozinhar não é só alimentar o corpo, mas também alimentar a alma. O que seria da Clara sem a sua cozinha?
Clara de Sousa – Seria uma pessoa mais pobre e insonsa. Menos criativa e despachada. A cozinha é um bom treino para outras facetas da vida. Quando temos de agir depressa e tentar fazer alguma coisa bem, se conseguimos é uma pequena vitória.
O livro A Minha Cozinha baseia-se na Clara enquanto mãe e mulher…
Este livro é feito como mãe e mulher. Nada tem a ver com a minha faceta de jornalista. É só como mãe e mulher.
Considera que este projeto é mais pessoal do que profissional?
É puramente pessoal e nada profissional. Não tem qualquer tipo de pretensão a esse nível. Isto foi um projeto pessoal num momento em que senti que me pediam para partilhar. Se não tivesse sentido esse apelo, acharia que não valeria a pena. O facto de ser uma pessoa conhecida pode beneficiar, mas nunca o faria só por causa disso. Seria demasiado vazio, não teria alma e não seria verdadeiro. Este livro só faz sentido por ser verdadeiro. A minha profissão é, de facto, mais exposta e de grande responsabilidade a esse nível, mas há pessoas que não têm profissões expostas e têm enormes responsabilidades. Quando estamos em casa, e somos mães e mulheres, somos basicamente iguais. Funcionamos da mesma forma, como qualquer ser humano. Eu, extra televisão, gosto de nutrir os meus afetos a todos os níveis, seja com os meus animais, seja com a minha casa e com a minha cozinha, que é o coração da minha casa. A minha única pretensão é que as pessoas compreendam a razão deste livro. Percebo que há algumas que não compreendam, mas fico, sobretudo, feliz pelas que compreendem. Não é nenhuma necessidade de exposição porque não precisava disso. É uma coisa natural, que já vem comigo e que tenho partilhado sempre na brincadeira. Nesse aspecto o objetivo está cumprido. É um elo de empatia, confiança, simpatia e, ao mesmo tempo, um desafio.
A sua profissão é um pouco stressante…
Mais ou menos… Depende da maneira como nos ligamos à profissão. Eu até sou bastante tranquila em relação à minha profissão. Sou mais ansiosa, quando alguma coisa em cima da hora começa a falhar.
Mesmo assim, considera que este livro é uma lufada de ar fresco?
Não sei… Acho que não devemos ficar muito fechados só naquilo que fazemos e termos um rótulo. Já fui muito criticada e atacada por isso, mas também não me importo. Cada duas ou três pessoas que fazem esse tipo de críticas, que eu aceito, há muitas mais que acham precisamente o contrário. Faço as coisas porque gosto. Nunca vou fazer uma coisa que não gosto só para ser diferente e ter um impacto. Se avanço para uma coisa, é porque gosto. Foi assim com a Família Superstar. Todos me diziam para não fazer e eu dizia que fazia parte da minha vida, dos tempos da rádio, da ligação à música.
O preconceito dos outros não a afeta portanto…
Podia ter-me prejudicado (na altura do programa)… Não sei. Na altura fi-lo porque gostava e até hoje tudo o que fiz de diferente foi porque gostava. Até mesmo no jornalismo foi porque gostava. Até podia ter sido professora, mas não… Tudo o que tenho feito na minha vida, nesse aspecto, é porque quero estar bem onde estou. Se não estiver, não funciono. Não sou capaz de prolongar situações de violentação constante interior. Quando me dedico a alguma coisa, quando me entrego, aquilo tem de me fazer bem. Seja lufada de ar fresco ou não, o que quis foi fazer algo verdadeiro, sem produções. Tinha de ser a Clara como mulher e como mãe.
Este livro é também uma homenagem à sua mãe…
À mãe, aos amigos, aos afetos…
O que acharia a sua mãe deste seu projeto?
Ficaria muito feliz… Seria um orgulho para ela e ficaria até um pouco envergonhada. Ela também nunca gostou muito de estar no centro das atenções. Gostava de comunicar através das coisas boas que fazia. Acho, acima de tudo, que ela não se importa que eu tenha partilhado as coisas dela porque acho que o objetivo é bonito. É não deixar que as coisas se percam. Hoje em dia há uma variedade tão grande de receitas que às vezes penso onde é que está a base. Nos anos 70, as pessoas faziam as coisas tradicionais. As pessoas começaram a cansar-se e tudo foi evoluindo. Mas quando se vai buscar o tradicional já não se sabe muito bem onde é que ele está. Acho que nesse aspecto ela perceberia que este back to basics das receitas é mais uma forma de não se perder e não ficar fechado só com algumas pessoas. Ficaria muito feliz de certeza, “babada” de uma forma diferente do meu pai. Ela dar-me-ia um sorriso.
O seu pai também acaba por ser uma inspiração para este livro.
Sim, do contacto com as coisas verdadeiras.
De que forma ele a apoiou neste projeto?
Ele não fazia ideia. Estive oito dias em casa e não contei a ninguém. E, como foi no verão, ele também estava fora, de férias, portanto foi fácil. Ele fica muito feliz até porque ele sente isto da mesma forma que eu. Ele trazia as coisas da terra. O meu pai é um homem de demonstrar muito afeto através daquilo que dá. É transmontano. Quando se entra em casa de um transmontano e não se come qualquer coisa, fica-se ofendido. O meu pai é assim. Aquilo que colhe é para distribuir por amigos, por vizinhos e pela filha. Ele cultiva, vê crescer, acarinha as coisas, acompanha e depois oferece.
A Clara recebe muitas opiniões e tem até um blogue de fãs, onde se podem visionar alguns textos sobre si. O que sente face a esse reconhecimento?
Nós não recusamos afetos, desde que sejam bem intencionados e não sejam doentios, porque infelizmente também há. Este livro acordou alguns. É puro carinho e pura admiração. Obviamente que me faz feliz. Quando é saudável.
É importante haver empatia e interação com o público?
Respondo sempre que posso, quando devo e se calhar, às vezes, quando não devo. Mas sim, acho que é importante. As pessoas também sentem que a sua opinião conta. Mas há pessoas que acham que tenho duas ou três pessoas a trabalhar para mim.
Acham?
Sim. Mas eu nunca colocaria o meu nome nas mãos de outras pessoas. É a minha opinião e seria demasiado arriscado. Qualquer dia não tenho tempo é para mim.
Muitas das receitas que podemos ver no seu livro são de amigos… Os seus amigos com certeza que a completam. Acha que isso é meio caminho andado para a felicidade?
Sim. Às vezes não são tantos assim. E alguns até estamos muito tempo sem os ver, porque têm as suas vidas. No entanto, sempre que nos reencontramos é como se nos tivéssemos visto no dia anterior e isso é muito bom. São coisas antigas e bem estruturadas, alguns deles desde os 19 ou 20 anos. E esses amigos também gostam de cozinhar e vamos trocando receitas. Mas eles não faziam ideia do que eu estava para aqui a “cozinhar”. Todos eles ficaram muito contentes.
Não pediu mesmo a opinião a ninguém para a realização deste projeto?
Não. Mas ficaram todos muito contentes. Os amigos e a família são muito importantes para os nossos afetos. Cada um deles no seu patamar.
Li, numa entrevista, que o que gostava mais era de ver que as pessoas de quem gosta estão realmente felizes. E a Clara considera-se uma pessoa feliz?
Enquanto tudo funcionar. É importante não nos focarmos apenas numa noção de felicidade porque é demasiado redutor. Mas não vou falar sobre relacionamentos. Não falo mesmo.
Já pensou num segundo projeto?
Este está como eu queria que estivesse, com o essencial, o miolo, a atitude e o espírito que queria. Há sempre aquela expectativa e estou muito feliz com o resultado final. Não tenho, neste momento, pretensão nenhuma de me lançar num segundo projeto e nem sei até que ponto um segundo sairia tão bem. Quando fazemos aquela equiparação aos filhos, todos eles são importantes, mas o primeiro é sempre aquele que tem uma multiplicidade de emoções, por ser novidade. Mas nada tem a ver com o amor e a felicidade que temos com cada um deles. É aquela situação da primeira vez e das primeiras emoções em relação a algo. Neste momento, não penso nisso. Neste, eu sinto-o como algo que tenha gerado.
Mas com certeza que terá outros temas, que não este, para se focar num segundo projeto além jornalismo.
Se achar que faz sentido, com uma série de condicionantes como aquelas que aconteceram neste livro, sim. Não sei o que o futuro reserva. Este fez sentido porque foi bidirecional. Se isso acontecer, tudo bem, senão vou continuar a trabalhar todos os dias que já é mais do que suficiente e que também é algo que me completa muito. Tenho a sorte de estar sempre a fazer coisas que gosto e as coisas nunca sairiam tão bem se estivesse contrariada a fazê-las. E, nesse aspecto, isso ajuda também à minha forma de estar na vida. Por isso é que às vezes sorrio um pouco mais, mas é porque sinto que tenho motivos para sorrir, até pelas pequenas coisas que me fazem bem.
Sente-se mais realizada por ter lançado este livro?
Mais realizada, não sei. Porque no fundo eu sempre fiz isto. Um pouco mais exposta nesta faceta, mas de uma forma perfeitamente assumida, para o bem e para o mal. É um projeto “mais eu”.
Que balanço faz deste ano que passou?
Nunca faço balanços de fim de ano… A partir de agora começa um novo ano e há uma sensação de renovação, mas sem balanço. Não faço balanços de fim de ano, nem quando faço anos. Faço os balanços quando tenho de fazer. Quando temos um furo no pneu, temos de sair do carro para mudar o pneu, portanto temos de encontrar as soluções na altura e pensar porque é que tal facto aconteceu e pensar que não podemos voltar a fazê-lo. É nessa altura que se deve fazer isso. Depois passam não sei quantos meses e já não nos lembramos muito bem de todos os factos. É melhor fazê-lo logo. Não espero por essas datas especiais. Não sou nada disso, nada. Vou mais pelo sentido prático das coisas. É na hora que tem que se resolver. O que é este ano trouxe de bom ou de mau? Nem me lembro de metade das coisas!
O que deseja para este novo ano?
Quero um País com mais razões para sorrir e com um pouco mais de esperança, apesar de sabermos que vai ser um ano muito mau. Também já passámos por outros momentos difíceis e saímos deles. Temos um espírito de solidariedade muito grande que se tem manifestado cada vez mais e acho que isso nos vai manter unidos e ajudar quem mais precisa. As redes sociais também têm ajudado muito nessa partilha de roupas de bebé, de alimentação, de coisas que já não se usam. O Banco Alimentar continua, graças a Deus, a recolher bastante. Esse espírito de solidariedade também nos vai ajudar, a sorrir neste ano que vai ser bastante difícil.
E a nível profissional?
Já tenho muita coisa para fazer. Nem sei se terei tempo para fazer mais. Se me está a perguntar se quero ter algum programa, isso não. O Jornal da Noite já dá muito trabalho. Já me preenche profissionalmente.
Texto: Cátia Matos; Fotos: Luís Baltazar; Produção: Manuel Medeiro; Maquilhagem: Vanda Pimentel com produtos Maybelline e L'Oréal Profissionell
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