É economista, aprendeu a pilotar aviões porque surgiu a ocasião e o apelido do tio puxava-a para os ares, mas também se orgulha de cozinhar, fazer a lida da casa, rendas de bilros, criar jóias, "alimentar" quatro blogues, publicar livros e, a sua faceta mais notória, ser a mãe de Paulo Portas e Miguel Portas, irmãos unidos nos laços familiares e opositores na política. Mulher de muitas paixões, Helena Sacadura Cabral acaba de publicar mais um livro, Caminhos do Coração, onde as viagens se misturam com retratos de vida, numa obra sem moral que remete para um estado próximo do sonho.
VIP – Nos últimos oito meses publicou seis livros. Como é que se organiza para tanta escrita?
Helena Sacadura Cabral – Sou muito germânica e tenho uma grande disciplina de escrita. Levanto-me às sete horas, às oito estou à frente do computador. Nunca tive o drama da página em branco nem o drama do ecrã preto. Tenho gravadores em todos os lados da casa, no carro e vou gravando coisas de que me vou lembrando para escrever. Sobretudo, escrever dá-me muito prazer e no dia em que deixar de dar eu deixo de o fazer.
Além dos livros alimenta quatro blogues…
Sim e um deles todos os dias. Mas eu sempre tive este ritmo de trabalho. Ainda hoje em dia leio muito sobre economia, que é a minha área de formação, e estudo muito. Nunca ninguém me ouviu dizer que sou escritora. O meu pai teve sempre uma grande preocupação com a linguagem. O nosso primeiro livro foi o dicionário do Torrinha [Francisco] e tínhamos de pôr cruzinhas nas palavras que não conhecíamos… Isso deu-me uma grande facilidade de escrita e de arranjar sinónimos. Acho que sou uma razoável comunicadora, uma razoável cronista… Tenho sentido de humor sobre mim própria, que é o primeiro ponto para alguém poder falar sobre os outros. Se não fosse assim, com a vida que tenho e a família que tenho, já estava a Lexotans…
Tanto nos livros como nas conversas, a Helena tem uma grande jovialidade e alegria de viver…
Tenho, sim. Andamos cá pouco tempo e sentimentos de culpa não adiantam nada a ninguém. Ser infeliz não custa nada porque somos todos um bocadinho, ser feliz é que é um custo brutal, mas como sou economista, em tudo na vida faço um custo-benefício. Se o custo é superior ao benefício, nem pensar. Se for igual, pondero. Se o benefício é superior, faço.
Nas pequenas histórias que conta neste livro não há uma moralidade… Há uma sabedoria popular.
Portugal evoluiu tanto que, se eu me agarrasse à moral com que nasci, já tinha morrido triste. Os meus conceitos de moral foram evoluindo, embora haja princípios básicos que são estruturantes em mim.
Os seus filhos, Miguel e Paulo, são referências constantes na sua vida?
Não há nada a fazer. Comecei por ser a mulher do Nuno Portas; depois, passei a ser a ex-mulher do Nuno Portas; a seguir, lá passei um período em que era a Helena Sacadura Cabral e agora sou a mãe dos Portas.
Como é que consegue gerir as diferenças ideológicas dos seus filhos?
Em minha casa fala-se de política, mas nós temos um grande sentido de humor sobre nós mesmos. Os meus filhos são muito amigos, o que é uma dádiva. Ambos pensam de maneira diferente da minha, mas é difícil dizer com qual é que eu me sinto mais identificada, até porque eles são muito parecidos: gostam das mesmas coisas, preocupam-se com os mesmos assuntos, mas cada um resolve os problemas de forma diferente.
Foi sempre fácil lidar com as diferenças deles?
Sempre. Na pior das hipóteses, eu dava dois "berros" e dizia: “Cá em casa quem manda sou eu.” Nem havia mais discussão.
No ano passado o Miguel foi operado a um cancro do pulmão. Isso uniu-vos ainda mais?
Sim, muito mais. O meu filho Paulo fez o que nem eu própria talvez fosse capaz de fazer em desespero e deu uma lição de amor fraterno, como estou convencida de que o Miguel faria se fosse ao contrário.
A sua intervenção tem sido sobretudo cívica. A política não lhe interessa?
Não me interessa à partida. Eu sempre pensei que o poder tem um efeito nefasto sobre as pessoas. Não noto isso nos meus filhos porque, possivelmente, não tenho a lucidez de os ver como outras pessoas os vêm, mas o exercício da política nos moldes que hoje é praticada exacerba o lado mais negativo de cada um. Quanto à intervenção cívica, quem como eu tem a sorte de ter tirado um curso e de, com esta idade, ainda ter trabalho, tem de, algum modo, devolver à sociedade aquilo que recebeu. Isso para mim é muito claro.
Muitas pessoas consideram que a crise em que vivemos é também culpa dos economistas.
Durante muito tempo eu pensei que as Económicas eram uma ferramenta de intervenção na sociedade, mas a verdade é que hoje a economia é um mero instrumento, o decisor é o político.
Como vê a forma como a sociedade mudou em relação às mulheres: foi para melhor ou foi para pior?
Não estamos melhor. Temos mais liberdade, mas pagamos essa liberdade porque trabalhamos muito mais. A minha avó tratava da casa e tinha muitos filhos, mas era só isso que fazia: tratava das crianças, fazia bolos, trabalhava muito porque fomos educados com gastos muito restritos, porque eram famílias numerosas… já eu, quando tive os meus filhos fui do emprego para a maternidade.
Como é que conciliou a sua carreira com a maternidade?
Cheguei a viajar com eles em serviço. No dia em que eu não fosse passava-me um homem à frente…
O divórcio não a impediu de se dedicar à carreira…
Às minhas duas carreiras, porque eu trabalhava durante o dia, dava aulas à noite e chegava a casa à uma da manhã ainda ia dar banho ao meu filho. Adaptei-me. Eu podia não ter tido filhos, mas queria tê-los e eles estão cá. Adaptei-me. Agora, fazerem de mim uma pessoa triste, isso é que não fazem.
Texto: Cristina Ferreira de Almeida; Fotos: Bruno Peres; Produção: Manuela Costa
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