Marisa Cruz não conteve as lágrimas ao passar em revista o seu passado de sofrimento. A apresentadora e atriz esteve presente na emissão desta sexta-feira do vespertino da TVI e, com Manuel Luís Goucha, teve uma conversa focada na ausência do pai e na inversão de papéis que foi obrigada a fazer com a mãe.
Marisa Cruz nasceu em Angola, poucos meses depois do 25 de Abril de 1974, e mudou-se para Portugal com apenas um ano. Veio com o pai e a mãe, que se encontrava à espera do segundo filho. Os progenitores acabaram por separar-se “mais ou menos” nessa altura, o que significa que não tem memórias deles juntos. “Se calhar, tenho mais memórias das fases más ou de coisas que me foram difíceis de ultrapassar. Tenho poucas memórias de coisas boas. […] Não me lembro de ter uma infância dita normal e isso, durante muitos anos, foi uma revolta muito grande. Era um peso que eu carregava que, felizmente, agora, consegui libertar”, admitiu a também modelo, eleita Miss Portugal em 1992.
A Carolina da novela “Bem Me Quer”, em transmissão na TVI, ficou a viver com a mãe aquando da separação. O pai não foi uma figura presente na sua vida. “Sempre criei uma fantasia na minha cabeça de um pai que eu gostaria que estivesse presente na minha vida. Só mais tarde é que percebi que, coitado, ele teve azar. Se calhar, escolheu mal os caminhos que tinha de percorrer”, referiu.
E que caminhos foram esses? O progenitor de Marisa Cruz enveredou pela criminalidade. A filha nunca soube de nada. Aos sete anos, reencontrou-o na prisão. Foi a última vez que o viu. “A última memória que tenho dele é muito bonita. Fui visitá-lo à prisão. Lembro-me de ele tirar do porta-moedas um fio de ouro com uma cruz e de mo dar. Aquilo, para mim, teve um valor… Não sei dizer…”, desabafou.
O pai acabou por morrer, mas a apresentadora e atriz só soube da fatalidade mais tarde: “Passados uns anos, disseram-me que ele tinha tido um acidente de automóvel no Brasil. Mas é tudo muito estranho. Fiquei, durante muitos anos, a acreditar que, se calhar, aquilo não era verdade e que ele não podia aparecer… (…) Vivia sempre na fantasia de que o meu ia aparecer um dia e que não tinha morrido.”
Mãe de Marisa Cruz “tinha muitos problemas”: “Eu é que lhe dava colo”
A mãe de Marisa Cruz não compensou a ausência da figura paternal na sua vida. Questionada por Manuel Luís Goucha, a estrela da TVI hesitou e acabou por responder: “A minha mãe era mais uma amiga que eu tinha… Também tive uma grande revolta com a minha mãe durante muitos anos. Agora, depois de ser mãe, já a compreendo e já perdoo. Não tenho de a perdoar, perdoo-me a mim por ter sido tão pouco tolerante com ela. Ela fez o que melhor sabia fazer na altura.”
Ainda assim, a apresentadora não esconde que lhe “faltou muito colo”. Mais: “Eu era o colo da minha mãe. Eu é que lhe dava colo. Eu cuidava da minha mãe. Eu era o pilar lá de casa”. A progenitora teve, entretanto, outro relacionamento, do qual nasceram quatro irmãos. “Eu tomava conta dos meus irmãos… (…) Eu era a mãe deles”, frisou.
Porquê? “Porque a minha mãe tinha muitos problemas”, revelou, sem adiantar mais detalhes por respeito à mãe: “Não quero estar a falar disso”. A mãe e o padrasto acabaram por se separar e os irmãos de Marisa Cruz mudaram-se com o pai destes para França.
Irmão de Marisa Cruz foi adotado. Reencontro deu-se ao fim de 40 anos
Ainda em criança, Marisa Cruz viu o único irmão nascido do casamento dos seus pais ser afastado de casa. Uma história que, à semelhança de tantas outras da sua vida, não sabe pormenorizar por completo.
“Não percebo muito bem essa história. Na altura, a minha mãe também não falava muito sobre isso. O que me foi dito é que ela ficou comigo e deixou o meu irmão aos cuidados de familiares próximos. Também é uma revolta muito grande para ele: porque é que ela, tendo dois filhos, leva um e deixa outro?”, vincou.
O irmão em questão acabou por ser adotado. “Durante muitos anos não soube dele, mas sabia da sua existência. Isso também seria uma coisa que eu, se pudesse, mudaria. Teria tentado entrar em contacto com ele mais cedo. Mas a minha vida foi tão… Tão confusa, sempre de um lado para o outro… Nós não parávamos. Eu era uma sobrevivente. Eu tinha de sobreviver, não pensava na falta que o meu irmão me fazia. Hoje, sinto que podíamos ter aproveitado ou ele podia ter-me dado outro apoio”, assumiu, no programa “Goucha”.
Marisa Cruz e o irmão estiveram “para aí” 40 anos sem se ver. O reencontro deu-se há poucos anos. “É como se nunca nos tivéssemos separados. A nossa tia em comum, irmã do nosso pai, sabia onde é que ele estava e proporcionou-nos o reencontro. Ele estava muito nervoso, eu também… Mas não [senti que ele] era um estranho… Havia uma vontade mútua muito grande de aproveitarmos o tempo que ainda temos”, afirmou.
Marisa Cruz recorre à terapia para sarar “feridas” e “muitos traumas”
Hoje com 46 anos, Marisa Cruz não esconde que os traumas do passado estão por resolver-se e prova disso são os olhos marejados de lágrimas que acabou por ter no decorrer da entrevista com Manuel Luís Goucha. “Sempre tive muita consciência de que precisava de curar estas feridas todas”, disse.
Feridas que estão longe de sarar. Mas o caminho já começou a ser trilhado. “Estão em processo”, referiu, revelando que recorre à terapia para a ajudar a ultrapassar “os muitos bloqueios e muitos traumas” vividos. “Mesmo em relação a relações de amizade e amorosas…”
A entrevista terminou com o apresentador que dá nome ao programa “Goucha” a declarar-se à colega de estação. “Sempre gostei muito de ti […]. Deixa-me dizer-te que eu desconhecia toda esta história. Sei que já a havias contado à Fátima [Lopes, no extinto ‘Conta-me Como És’] há algum tempo, mas eu não vi esse programa. Fiquei muito surpreendido e fiquei com uma absoluta admiração para sempre por ti. Que grande mulher que és!”, atirou.
Texto: Dúlio Silva; Fotos: reprodução TVI e redes sociais
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