Júlio Magalhães recordou a morte do pai e da irmã, numa entrevista a Maria Cerqueira Gomes. O jornalista, que saiu recentemente do Porto Canal, esteve no programa “Conta-me” deste sábado, 30 de janeiro, e abriu o coração para falar destes momentos difíceis da sua vida.
“São as perdas que temos na família…”, lamentou o mais novo de três filhos de “uma família que sempre foi muito junta, muito unida”. “A minha irmã tinha 56 anos quando desapareceu. Nunca falamos muito disso… Família é família. Na altura, foi uma perda grande para nós, claro. Como o meu pai tinha sido pouco tempo antes”, recordou, revelando que o progenitor morreu na semana que marcou o arranque de uma nova fase na sua vida: a entrada no pequeno ecrã através da RTP: “O meu pai morreu na semana em que eu entrei na televisão. Ele já estava no hospital e eu ainda lhe disse, para o animar, que ia para a televisão”.
Juca, como é carinhosamente tratado pelos amigos, lembra-se de que o pai “sorriu na altura”. “Mas não sei se ele percebeu que eu ia mesmo para a televisão. A partir daí, fiquei por minha conta”, atirou.
Júlio Magalhães e as memórias de retornado: “Ficámos sem nada”
Nascido no Porto, em 1963, o jornalista tinha apenas sete meses quando partiu para Luanda, Angola, onde ficou a morar um ano. Viveu, depois, 12 anos em Sá da Bandeira (hoje Lubango). “Viemos [para Portugal] a seguir ao 25 de Abril e acho que tenho em mim muito de África”, constatou.
“Fiz a viagem de carro de Sá da Bandeira para Luanda. Eu e o meu irmão viemos à frente para estudar, para começar o ano letivo. A minha irmã, o meu pai e a minha mãe ainda lá ficaram. Trouxeram-nos a Luanda e há um momento, no aeroporto de Luanda, em que tenho de me despedir da minha mãe e do meu pai. Isso foi violento, claro. Era muito miúdo. Embora viesse com uma ilusão tremenda… Quem vivia em África tinha uma ilusão tremenda da metrópole, de Lisboa, do Porto…”, contou.
Júlio Magalhães descreveu a sua despedida dos pais como “dura” e “muito difícil”. Chegado à Invicta, foi recebido por uma familiar. “Aterrei no Porto e a minha prima levou-me diretamente ao Estádio das Antas, porque o FC Porto estava a jogar. Ainda vi a segunda parte do jogo. Depois é que fomos para casa”, recordou, com um sorriso.
A família compôs-se pouco tempo depois. “Viemos de África e, quase como toda a gente, ficámos sem nada. Os primeiros tempos cá foram duros, porque tínhamos de trabalhar. Aos 16 anos, já colaborava como jornalista n’O Comércio do Porto. Fazia jogos. Aos 18, era profissional”, referiu.
“As mães de alguns amigos meus não queriam que eu fosse às suas casas”
Sobre esses tempos, Júlio Magalhães lembra-se do “choque muito grande”. “Vivíamos numa casa que não era propriamente muito confortável. […] O Porto era uma cidade muito cinzenta, onde começava a chover em outubro e só acabava em abril. Eu andava com cinco camisolas, com uns casacos… Não aguentava o frio. Foi um choque grande porque nós, em África, tínhamos uma vida relativamente confortável que cá, nos primeiros tempos, não foi. A nossa sorte foi que tínhamos cá família, que nos ajudou imenso.”
“Tive de ir trabalhar. O meu pai teve uma empresa de colchões e, depois, teve uma empresa de candeeiros. E eu ainda com o meu irmão a trabalhar nessas duas empresas. O meu irmão trabalhou muito com o meu pai e eu muitas vezes carreguei candeeiros e colchões para distribuir. Tinha de acumular as coisas… Todos tínhamos de ajudar. Portanto, foi um choque grande”, acrescentou.
Mas “o choque muito grande” deveu-se também à “mentalidade” das gentes da altura. “O Porto era uma cidade muito fechada na altura. Os meus amigos da escola e do basquetebol viviam muito em casa. Lá [em Angola], nós vivíamos ao ar livre”, começou por dizer, para depois complementar: “Na altura, havia um estigma sobre as pessoas que vinham de África. Eram os chamados retornados. Lembro-me que as mães de alguns amigos meus não queriam que eu lá fosse [às casas], porque eu tinha vindo de África e era outra mentalidade. Quantas vezes…”
As dificuldades foram ultrapassadas “um ano, dois anos” depois do seu regresso ao Porto. “Foi aquele choque inicial. Depois veio toda a gente e isto evoluiu. As pessoas começaram a ter outros tipo de convivência e as coisas passaram. Faz parte…”, desvalorizou.
Em entrevista a Maria Cerqueira Gomes, Júlio Magalhães falou ainda da saída do Porto Canal, de que era Diretor-Geral, e dos tempos de terror que experenciou na TVI: “Vivia num desespero total. Todos os dias havia problemas”. Leia tudo aqui.
Texto: Dúlio Silva; Fotos: Arquivo Impala e reprodução redes sociais
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