O livro de Cristina Ferreira foi lançado há oito dias e tem dado muito que falar. “Pra Cima de P***” foi o motor de arranque para uma discussão sobre o ciberbullying que teve lugar no Jornal das 8 deste sábado, 28 de novembro, depois de uma reportagem sobre o tema, da autoria de Susana Pinto, que contou com o testemunho de Carolina Deslandes, Rita Pereira e Isabel Figueira.
No início da conversa com José Alberto Carvalho, a Diretora de Entretenimento e Ficção da TVI voltou a explicar que a sua nova obra surge na sequência da “saída da SIC para regressar” àquele que sente ser “o seu lugar.”
“Recebi centenas de mensagens a partir do momento em que anunciei o livro […]. Não são criticas, sao ofensas, injúrias. São uma tentativa clara de destruir a minha moral, de destruir quem sou profissional e pessoalmente […]. A minha passagem da TVI para a SIC nada teve a ver com o meu regresso à TVI. As pessoas não entendem porque é que houve uma mudança, porque é que tinha corrido tão bem esta mudança e porque é que eu queria voltar. Não entenderam que era uma escolha minha pessoal. Era uma escolha que só eu sabia porque. Ninguem tem noção do que é a minha vida”, disse.
“Este livro não é uma vigança nem um caso pessoal”, diz Cristina
Depois de anunciar o seu regresso à TVI, Cristina esperava algumas reações mais negativas por parte dos telespectadores, mas o “sem número de ofensas” foi algo inesperado que a fez reagir escrevendo este livro, com a ajuda de especialistas, para tentar ajudar todos aqueles que passam por este tipo de bullying, através das redes sociais.
“Se senti, por vontade própria, que queria aqui regressar, têm de aceitar. As consequências são minhas, sou eu que as pago, mas estas não. Isto estava a fazer-me muita confusão. Eu questionava-me porque é que isto está a acontecer. Isto não acontece só comigo e este livro não é uma vigança nem um caso pessoal. Este livro é acima de tudo para que a sociedade possa refletir sobre ele. Para que cada um de nós saiba que, no momento em que faz um comentário numa rede social, está a atingir o outro”, explicou.
Depois de lançar o livro “Pra Cima de P***”, Cristina Ferreira recebeu uma mensagem que a marcou e que garantiu ser a descrição “perfeita” daquilo que é a sua obra: “Dizia-me esta senhora: ‘No secundário, alguém escreveu na capa do meu livro Os Bichos, de Miguel Torga, ‘és uma p***’. E lembro-me como se fosse hoje o que senti, como era injusto nunca saber quem o fez e nada poder fazer para que essa pessoa não saísse impune desse ato miserável. Estávamos em 1990. 30 anos depois, persiste este desfiar de injúrias hediondas e a impunidade para quem as destila. A Cristina está a travar quem manchou o meu livro e a minha dignidade. Obrigada por lutar por todos’.”
“A mim não me dói, mas tenho medo que doa a outras pessoas e não resistam”
A apresentadora da TVI quis ainda deixar claro que as ofensas que recebe diariamente nas redes sociais “não a tocam” e que este livro não se trata de “um caso pessoal”, mas sim da exposição de uma realidade que afeta muitas pessoas.
“Estou revoltada e tenho algo a dizer. Acabei de estar seis horas no ar e nunca estive nervosa, agora estou aqui aflita. É que a mim não me dói, mas eu tenho muito medo que isto doa a outras pessoas e que elas não resistam. Tem sido muito difícil lidar com uma campanha destrutiva. O meu filho lê todos os dias, o meu pai lê todos os dias, a minha família lê todos os dias. E eles sabem a filha, a mãe, a pessoa que têm na família. E não é isto, não é estes comentários”, afirmou, de lágrimas nos olhos. “Cada um de nós já sentiu isto na pele. Imaginem o que é sentir isto diariamente, em milhares de comentários”, acrescentou para depois dizer que não se importa que os telespetadores “comentem o seu trabalho”, mas não pode admitir “ataques pessoais.”
“Pretendo não me calar. Um dia destes pode ser o seu filho a suicidar-se”
Nas redes sociais, são vários os comentários de cariz sexual que a apresentadora recebe e, em relação a essas abordagens, Cristina Ferreira considerou que se deve ao facto de “estarmos no meio de uma cultura machista em que o homem se sobrepõe.”
Porque é que as mulheres são acusadas de más, agressivas, de falarem mais alto, de imporem a sua opinião… Porque é que quando um homem o faz, não se diz essas coisas? Isso faz-me muita confusão. Se eu posso usar a minha imagem pública, o meu próximo passo é que exista uma petição pública para que isto possa ser discutido. Pretendo não me calar. Pretendo que a discussão chegue a quem de direito, pretendo que essas pessoas percebam que estes últimos anos as redes sociais já nos mostraram que caminho levam. Esta discussão é urgente e a aplicação de leis tem de ser pensada o mais rápido possível”, disse. “Temos de alterar esse sentimento de impunidade. Não o podes dizer, não o podes fazer”, acrescentou.
“Pode ser a sua filha. Pode ser o seu filho. Um dia destes, pode ser um deles a não aguentar o que lhe dizem e suicidar-se a seguir. Este livro não é meu, este livro é de todos”, terminou.
Todas as receitas vão ser entregues a associações que combatem o bullying
Cristina Ferreira explicou ainda que todas as receitas do livro “vão ser entregues a associações que combatem o bullying”.
“Mesmo que fosse para vender, todas as receitas vão ser entregues a associações que combatem o bullying. E por isso mesmo, qualquer euro que este livro possa vir a dar, não me será entregue a mim, será entregue a quem ao meu lado, a partir deste momento, luta pela dignidade de todos os outros e isso é o principal no meio de tudo isto. Estamos a falar daquilo que já está convencionado, não só na nossa constituição, como também na declaração universal dos direitos humanos. Temos todos direito à nossa dignidade, à nossa vida, à nossa privacidade, à nossa vida familiar e isso está ali, não está é aplicado na lei. E é preciso e é preciso fazê-lo”, disse.
Texto: Mafalda Mourão; Fotos: Reprodução TVI
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