Maria das Dores, conhecida socialite dos anos 2000 – que em 2007 mandou matar o marido, o empresário Paulo Cruz, tendo sido condenada a 23 anos de prisão um ano mais tarde – foi entrevistada por Cristina Ferreira.
«Acho que tudo o que me aconteça de mal, eu mereço. E mereci», começou por dizer Maria das Dores nesta entrevista bastante intimista. «Quando entrei na prisão, houve um processo de negação; depois a expectativa de visitar o meu filho [Duarte, fruto do casamento com o empresário]; a seguir continuei num processo de negação. Dizia para mim mesma que nada tinha acontecido, que estava ali por engano. Três, quatro anos depois, comecei a aperceber-me de que, na realidade, tinha causado uma catástrofe. Tinha vitimizado muita gente. E tinha sido a causadora daquilo tudo. E aí comecei a sofrer, a aperceber-me do porquê. E a fazer introspeções atrás de introspeções (…) Encontrei a resposta. Se bem que é uma resposta que não é por mim aceite. Porque ninguém tem o direito de tirar a vida a ninguém. E isso, nunca me vou desculpar. E não vou desculpar-me também de o meu filho não ter crescido com o pai e com a mãe», disse, emocionada.
«Quando o conheci foi uma paixão avassaladora»
Maria das Dores começa por contar que, quando conheceu Paulo Cruz, «foi uma paixão muito grande». «Quando o conheci foi uma paixão avassaladora (…) Idolatrava-o (…) Nós davamo-nos muito bem. Eu era casada. Contrariamente ao que se diz, eu tinha uma vida. Trabalhava num banco (…) Não cometi este crime por dinheiro. Cometi este crime por ciúme e por me sentir com a autoestima completamente em baixo. Porque eu era, simplesmente, maltratada», recorda.
«Comecei a sentir que estava gorda (…) Fui-me apercebendo do afastamento… rejeição em termos íntimos, porque lhe fazia confusão o braço [que teve de amputar por consequência de uma acidente de viação, onde Paulo Cruz ia a conduzir]», admitiu.
A morte «encomendada» de Paulo Cruz
Maria das Dores atraiu o empresário a um apartamento na Avenida António Augusto de Aguiar, em Lisboa, que havia sido arrendado pela família para se mudar do Lumiar para o centro da cidade. Lá, foi surpreendido por dois homens que lhe deram duas pancadas mortais na cabeça.
«A Maria mandou matar o seu marido», disse-lhe Cristina Ferreira. Sem nunca negar, Maria das Dores fala sobre o que lhe passou pela cabeça na altura para o fazer. «Sim (…) Não pensei. Foi da noite para o dia. Foi depois de muita muita coisa. Muitos episódios de maus-tratos verbais. De me chamar ‘Maria gorda’, de dizer: ‘Olha aquela tão gira’. Depois de tantas coisas feias. E de eu cada vez me sentir mais pequenina. Quando toda a vida me senti uma mulher segura, uma mulher bonita. Sentia-me uma mulher segura, mesmo com apenas um metro e cinquenta e três centímetros. Era tratada como ‘não tens braço. Pesas 100 quilos’.»
«Disse só [ao motorista] que queria que lhe batessem. E ele perguntou: ‘mas bater como?’ e eu disse: ‘quero que o Paulo morra. Quero que o meu marido morra’. Disse isso», confessa. «Não consegui nunca ver. Acho que queria entrar parta evitar. Porque, no fundo, telefonei e acabei por ir lá bater à porta. Não sei. Acho que estava a tomar anfetaminas que me tinham trazido do Brasil, para emagrecer, e deu-me um clique na cabeça. Arrependi-me logo. De repente, disse aquilo e, depois, quando estava a caminho do Campo Grande telefonei (…) Voltei para lá, comecei a bater à porta, chamei os bombeiros, a polícia, bati à porta da porteira», relembra.
«Estou tão arrependida»
Até hoje, Maria das Dores não encontra explicação para o que se passou em 2007 e diz estar profundamente arrependida do que fez. «Aquilo foi um momento que eu tive. Comecei a pensar em tudo. Fiquei sem um braço. Ele não esteve no velório da minha mãe. Pensei em tudo. ‘Vais-me pedir o divórcio. Vais ficar com o Duarte (filho mais novo). Eu, se calhar, vou ficar sem nada. Eu não posso ficar sem o Duarte’. Eu sabia que ele me ia pedir o divórcio. Eu não queria. Não sei explicar. Estou tão arrependida», diz. «Levei anos a pensar que o ia reencontrar, quando saísse. Não sei explicar o que se passou comigo».
«Tudo de mal que me aconteça é pouco»
Consciente do crime que cometeu, Maria das Dores garante que não é nenhuma «psicopata». «Ninguém tem o direito de tirar a vida a ninguém. É o que sei. E eu fi-lo. Portanto, tudo de mal que me aconteça é pouco. Tenho de pedir perdão às pessoas que vitimizei. Agora, não sou uma psicopata nem ando para aí a pensar em matar pessoas. Acho que a paixão que tinha por ele tocou o ódio, naquele dia. Tínhamos estado em Nova Iorque e as coisas tinham corrido tão mal. Ele tratou-me tão mal em dezembro, isto foi em Janeiro».
Maria das Dores é tida como uma reclusa tranquila, que trabalha na biblioteca e está presa desde 2008 no Estabelecimento Prisional de Tires. Em janeiro do ano passado, 10 anos depois de ter sido presa, Maria das Dores foi recompensada com a primeira saída precária onde lhe foi permitido passar três dias em liberdade.
Texto: Joana Dantas Rebelo; Fotos: Impala
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