Ljubomir Stanisic cansado
«Já chega de Pesadelo [na Cozinha]»

Nacional

Ljubomir Stanisic, um dos chefs convidados do novo programa da RTP1, fala sobre a TVI, a infância e a educação dos filhos.

Qui, 11/04/2019 - 19:02

O novo programa da RTP1, A História da Gastronomia Portuguesa, estreou a 23 de março e um dos chefs convidados é Ljubomir Stanisic. Da TVI para a estação pública, a jugoslavo deu uma entrevista ao jornalista Vítor Gonçalves onde falou sobre o novo programa, sobre Pesadelo na Cozinha, a sua dura história de vida e sobre a relação com os filhos.

A vida do chef – que prefere ser tratado por cozinheiro – anda desde cedo em torno da comida. Seja pela falta dela nos tempos da guerra na Bósnia, seja pelo caminho profissional que escolheu.

«O melhor momento de comer não depende daquilo que estamos a comer mas sim com quem estamos. As melhores refeições na vida são aquelas que acontecem num momento único», conta. Para Ljubomir, a melhor refeição que teve foi no início da relação com a mulher, Mónica Franco, com um vinho barato e um tacho na praia de Milfontes porque «foi um momento único».

Ainda sobre as refeições prazerosas, refere as que a mãe confeccionava no pós guerra, em Sarajevo. «Depois de quatro anos em refúgio e de não ter nada para comer, uma coisa quentinha era sofisticado. Ela não cozinhava há anos, estávamos fartos de receber pacotes de comida da Cruz Vermelha, diariamente recebidos», conta, recordando os tempos mais duros que viveu.

Ljubomir critica Pesadelo na Cozinha 

Em Portugal, subiu a pulso após ter passado fome e levado restaurantes à falência. Chegou à televisão em 2011 com a participação como jurado na primeira edição do programa de televisão Masterchef Portugal, na RTP1 e mais tarde, em 2012, os direitos do seu programa Papa-Quilómetros foram adquiridos pela Fox Internacional. No entanto, só em 2017 deu o ‘salto’ para o estrelado ao apresentar Pesadelo na Cozinha, na TVI. A sua participação esteve sempre envolta em polémica, fosse pela linguagem utilizada pelo chef, fosse pela especulação se ele faria ou não a segunda temporada. Verdade é que Ljubomir elevou a TVI a níveis de audiência históricos, mas fartou-se. Para o chef, A História da Gastronomia Portuguesa é bem mais a sua praia.

«Foi um dos programas que me deu mais gozo fazer na vida porque tem que ver com a realidade de Portugal». Refere que é um programa «fora de formato e num registo de interesse público em geral, o que não é um Pesadelo na Cozinha», criticando o formato da TVI do qual fez parte.

Respondendo à pergunta de Vítor Gonçalves sobre se gosta de fazer televisão, o jugoslavo admite que sim, que lhe dá «gozo», mas que está cansado. «Já chega de Pesadelo», dizendo ainda que não gostava de ficar agarrado à imagem do programa da estação de Queluz. Sobre a ‘personagem’ que desempenhou no programa da TVI, diz que foi ele mesmo, que se «encaixou com o programa». «Eu sou aquela pessoa, diariamente trabalho assim. O formato leva-nos para reagir assim. Eu digo asneiras», conta.

«Não sou pessoa para tomar conta das contas»

Sobre o mediatismo que ganhou a partir de 2017, afirma que não lucrou mais porque não quis: «Sou de leste mas não sou p**a», dizendo ainda que se ganha mais dinheiro na cozinha do que na televisão. Relembrando os seus primeiros tempos na restauração em Portugal, reitera que é péssimo a gerir contas, e que foi por isso que o espaço 100 Maneiras, em Cascais, foi à falência em 2008.

«A melhor parte que eu sei é gastar o dinheiro, agora geri-lo… Não sou pessoa para tomar conta das contas nem nunca vou fazê-lo»

«A minha infância foi uma me***»

Com catorze anos já disparava armas e trabalhava numa padaria, de noite, para sustentar a família. Refere que dessa fase não tem traumas e que ficou um homem mais forte.

«A minha infância foi uma me***. Não tive qualidade nenhuma. Foi dura, pesada. Antes da guerra tive uma infância feliz. Jogava basquetebol, vivia na classe média, vivia bem, tinha amigos, andava um pouco à pancada… Comecei a trabalhar muita cedo, aos 14 anos, para sustentar a família com quem estava refugiado em Belgrado. Odiava aquilo que estava a fazer. Odiava o cheiro a pão porque tinha de trabalhar à noite para ir à escola durante o dia», lembra.

«Tive sorte de não levar nenhum tiro»

No final, tendo que analisar, Ljubomir considera que para ele, a guerra foi uma coisa positiva. «Fez de mim um homem corajoso e sem medo. Um homem que pensa na família e quer protegê-la». Sobre ter participado, efectivamente, na guerra, não quer falar sobre isso dizendo apenas: «Dei tiros sim senhora, ainda hoje sei desmontar todas as armas. Tive sorte de não levar nenhum tiro».

Veio para Portugal farto da dureza dos tempos que viva. A irmã Natasha veio antes e o chef apareceu em terras lusas depois. A mãe terá chegado em terceiro e hoje em dia trabalham os três juntos. Sobre os portugueses, lamenta a inveja mas gaba a hospitalidade.

«As pessoas recebiam-me em casa, convidavam-me para ir comer a casa deles. Aconteceu-me em vários sítios. Uns velhinhos convidaram-me para ir comer lá a casa porque perceberam que eu estava a roubar umas latas de atum numa drogaria, em 1997. Perceberam que eu não estava a roubar por roubar, era porque tinha fome. Esta é a parte mais valiosa que o povo tem».

Pai de dois filhos, considera-se um progenitor «espectacular e orgulhoso». Estuda com eles, tira férias para passar com as crianças, vão à pesca e à caça com o pai.

«Tenho filhos com ótimas notas, super bem-comportados, vão para o restaurante e não abrem um Ipad para terem que estar sossegados. Criticamos comida, o Mateus já prova vinhos, o Lucas já cheira vinhos. Estou a educá-los e encaminhá-los da melhor maneira que sei».

Texto: Redação WIN/Conteúdos Digitais; Fotos: DR 

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